São Paulo – "Esta viagem não é indicada para idosos, pessoas com comorbidades e crianças. O momento agora é outro".
Foi com essas palavras premonitórias que Fátima Aparecida Pleti, de 61 anos, fez a última convocação, por uma rede social, para que outras pessoas indignadas com o resultado da eleição presidencial embarcassem em um ônibus em Bauru, no interior paulista, com destino a Brasília, para participar do ato golpista do último domingo (8/1).
Por volta de 19h do sábado (7/1), um grupo carregando malas, travesseiros e bandeiras do Brasil posava para fotos em frente ao ônibus fretado para a excursão à capital federal.
Organizadora da caravana, Fátima havia anunciado o retorno para esta quarta-feira (11/1), mas a viagem terminou na Penitenciária Feminina do Distrito Federal, conhecida como Colmeia.
O nome de Fátima consta na lista de golpistas presos pelos ataques às sedes dos Três Poderes em Brasília ocorridos no domingo.
Até a noite de terça-feira (10/1), a Polícia Federal já havia prendido 727 pessoas acusadas de envolvimento na invasão e depredação do Palácio do Planalto, do Congresso Nacional e do Supremo Tribunal Federal (STF).
Antes de organizar a caravana golpista que partiu de Bauru, Fátima já havia se engajada em campanhas bolsonaristas. Nas eleições de 2022, trabalhou para o candidato a deputado estadual Luiz Carlos Valle (PL), que não se elegeu na região.
Ainda durante a campanha, também postou foto com o novo governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), ex-ministro e afilhado político do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
Foi a indignação com o resultado das urnas e a derrota de Bolsonaro que a levou para a porta de um quartel em Bauro e, posteriormente, para Brasília. A viagem, como explicou Fátima em postagem do Facebook, tinha um objetivo: "Respeitosamente demitir nossos funcionários do STF, vagabundos comunistas".
O ônibus de Fátima partiu do Graal de Bauru, na rodovia Marechal Rondon, altura do km 342, no início da noite de sábado. O trajeto de mais de 900 km previa mais de 12 horas na estrada. Por isso, o grupo se permitiu algum conforto e fretou um ônibus semi leito, cuja poltrona é ligeiramente mais larga e possui maior inclinação do que a de um ônibus de viagem executivo.
O veículo, que conta com ar-condicionado, televisão e wi-fi, pertence a uma empresa de turismo sediada em Jaú, a menos de 60 km de Bauru. A capacidade é de 42 lugares. Uma passagem convencional de ida de Bauru até Brasília custa cerca de R$ 360.
A primeira convocação nas redes para a viagem ocorreu apenas dois dias antes da partida. No dia 5 de janeiro, ao fim da tarde, Fátima divulgou o itinerário e avisou que o valor a ser pago pelo ônibus era de R$ 350 por pessoa. A justificativa para o preço foi de que a missão não contava com o auxílio financeiro de nenhum empresário.
"Caso haja o apoio integral de algum benfeitor, no valor do ônibus, devolveremos o valor", acrescentou Fátima.
Na mesma postagem, ela divulgou uma chave de Pix para onde o dinheiro deveria ser transferido. O Metrópoles apurou que o destinatário do e-mail informado era Willian da Silva Machado, que já foi candidato a vereador de Bauru pelo Solidariedade, em 2020, e não se elegeu. Ele não foi localizado pela reportagem para comentar o caso. O espaço segue aberto para manifestação.
Fátima entre Tarcísio de Freitas e Marcos Pontes durante a campanha eleitoral de 2022 Fátima ao lado de Luiz Carlos Valle, para quem trabalhou durante a campanha de 2022 Publicidade do parceiro Metrópoles 1 Fátima e a prefeita de Bauru, Suéllen Rosim (Patriota) Grupo reunido no Graal antes de viagem a Brasília Publicidade do parceiro Metrópoles 2 Ônibus deixou Bauru com destino a Brasília na noite de sábado (7/1) Caravana viajou mais de 900 km para participar de atos golpistas 0No sábado, horas antes da viagem, Fátima anunciou que ainda restavam vagas no ônibus. Desta vez, sem arcar com nenhum valor e com a possibilidade de hospedagem gratuita, que ainda estava em negociação pelo grupo.
A postagem avisava que a previsão do tempo era de chuva e que seria de bom tom levar na mala "vestuário e calçados para trocas".
O texto também continha outras orientações para a caravana, principalmente para quem quisesse levar a própria barraca: colchão, travesseiro e cobertor seriam por conta e responsabilidade de cada um.
"Lá há somente banheiro químico e o banho é com água gelada", acrescentou.
Em Brasília, ainda segundo Fátima, haveria barracas de alimentação gratuita para os viajantes. "Entretanto, há muitas filas", ponderou. Para a viagem em si, estimada em mais de 12 horas de duração, ela relatou ter providenciado água, refrigerante, pães e frios.
Ainda não se sabe quem bancou a caravana organizada por Fátima — identificar os financiadores é um dos objetivos da investigação da PF. O que é certo é que o plano de tomar o poder à força e voltar para Bauru não vingou.
Fátima e outras centenas de golpistas foram presos entre domingo e segunda. Os homens detidos foram encaminhados ao Complexo Penitenciário da Papuda, onde muitos dos condenados pela Operação Lava Jato cumpriram pena. Já as mulheres seguiram para a Colmeia. Fátima Pleti estava entre elas.
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