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Contratações em tecnologia encerram 2022 com 'dezembro terrível'

Por Midia NAS em 20/02/2023 às 06:15:27

Os dados constam do Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados) –registro do governo sobre as movimentações do mercado de trabalho formal.

Ainda que o número para o setor seja positivo, representa queda de 88,3% em relação aos 3.645 novos empregos de dezembro de 2021. Na comparação com novembro de 2022, o corte foi ainda maior: 89,6%, Empresas costumam rever seus gastos com pessoal no fim do ano.

O estoque de profissionais de informática cresceu 29,6% entre dezembro de 2022 e janeiro de 2020, quando o Novo Caged começou a contabilizar o vaivém desses postos de trabalho. Os números totais de empregos são divulgados uma vez por ano na Rais (Relação Anual de informações Sociais).

No período em que todos os empreendimentos não essenciais tiveram de se adaptar à operação digital, o Ministério do Trabalho começou a cadastrar duas novas ocupações: analista de testes de tecnologia da informação e arquiteto de soluções de tecnologia da informação.

A procura por profissionais de tecnologia era tão alta que jovens atuantes em modelo remoto passaram a pedir demissão no país em busca de melhores condições de trabalho, aos moldes do que acontecia nos Estados Unidos e ganhou o nome de "grande renúncia". Estudo da Firjan (Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro) captou esse movimento.

Ao longo de 2022, as empresas tomaram a iniciativa. No Brasil, a startup de transporte viário Buser anunciou o corte de 30% da sua folha de pagamento em dezembro. Após a compra do Twitter pelo bilionário Elon Musk no fim de outubro, a rede social reduziu sua força de trabalho de 7.000 para 2.000 colaboradores –no Brasil, não há mais sequer representante de comunicação.

Como a Folha mostrou, em 2023, os desligamentos continuam –a reportagem contabiliza ao menos 2.600 neste ano. Após anunciar o corte de 12 mil colaboradores ao redor do mundo, o Google, por exemplo, demitiu 70 funcionários dos escritórios brasileiros.

Executivos, em geral, alegam instabilidade da economia global para enxugar a operação.

Uma carta vazada da administradora de fundos de investimentos TCI à Alphabet, holding detentora do Google, mostrou a pressão de acionistas para que empresas de tecnologia aumentassem margens de lucro. Um dos meios para isso é cortar gastos com pessoal; outro, reduzir salários.
Funcionários de outras big tech que tiveram dispensas globais confirmadas dizem, reservadamente, viver ansiosos com a possibilidade de demissão.

Dados como os da pesquisa Brasscom (Associação Brasileira de Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação) de 2021 que estimaram uma demanda de 797 mil talentos de tecnologia entre 2021 e 2025 já não correspondem à atual realidade, segundo economistas ouvidos pela reportagem.

Os dados do Caged mostram, contudo, que algumas carreiras estão mais protegidas neste período de instabilidade. Entre os engenheiros de aplicativos em computação, que projetam programas de computador e outras tecnologias de segurança da informação, novembro de 2022 foi o único mês desde 2020 em que houve menos contratações do que demissões –foram só dois desligamentos a mais.

Entre os profissionais de informática, os engenheiros da computação também são os com maior salário médio na admissão: R$ 13.208, segundo pesquisa da Firjan. O grupo apresentou a maior alta no estoque considerando as mudanças medidas pelo Caged desde o início de 2020 –de 7.775 profissionais para 17.471 (crescimento de 124,7%).

Segundo a vice-coordenadora do curso de Engenharia da Computação da USP de São Carlos, Simone do Rocio Senger de Souza, os alunos dessa graduação têm formação aprofundada em computação e eletrônica, incluindo projeto, testes e desenvolvimento de sistemas de software, sistemas embarcados, inteligência artificial, robótica, e microeletrônica.

"Esses estudantes podem se especializar em assuntos de interesse como sistemas computacionais de alto desempenho, robôs móveis, comunicação, computação móvel e ciência de dados", afirma.

Ela ressalva que as carreiras classificadas pela indústria como engenharia da computação nem sempre são ocupadas por alunos do curso homônimo. "Pode ter pessoas que vieram de ciência da computação, de sistemas de informação ou até de outras engenharias."

Formado em engenharia civil também pela USP de São Carlos em 2018, o rondoniense Lucas Neuhaus, 28, decidiu fazer uma transição de carreira para a área de desenvolvimento de software em 2020. Ele chegou a ingressar no curso de sistemas de informação na mesma universidade, mas conseguiu entrar no mercado antes de concluir a segunda graduação e nunca a finalizou.

Desde 2021, Neuhaus passou por três empresas, todas estrangeiras. Ele diz preferir trabalhar para empresas de outros países por ter a garantia de continuar no trabalho remoto e por receber em dólar, cotado a mais de R$ 5 nos últimos meses.

Hoje, o engenheiro atua como desenvolvedor "front-end" –responsável pela interface entre o aplicativo e o usuário– para a startup de entregas Lazzy, com sede em Nova York. "O maior desafio foi superar a síndrome do impostor. Achei que demoraria anos para conseguir atuar de igual para igual com um profissional do exterior. Agora, percebo que eu posso ter a solução do problema."

Embora atue em uma função coberta pela engenharia de computação, Neuhaus não é contabilizado pelo Novo Caged por não fazer parte do mercado formal brasileiro.
A situação não é de tanto otimismo para administradores de redes e técnicos em programação de máquinas industriais. Essa última profissão viu seu estoque de empregados celetistas cair 1,4% desde 2020, enquanto a primeira cresceu apenas 0,4%.
Formado no curso Redes de Computadores pela Uninabuco, o pernambucano Albert Ribeiro, 28, tornou-se desenvolvedor "back-end" autodidata –profissional que cuida da infraestrutura de um site ou aplicativo. Perdeu, entretanto, o emprego formal como programador sênior em janeiro. Desde então, ele busca uma nova vaga no país ou no exterior.
"Prefiro continuar trabalhando no Brasil, para empresas brasileiras, mas não me iludo que o mercado nacional vai respeitar e valorizar quem faz essa escolha pensando no país em que vive. Quando CEOs acharem que devem demitir em massa, vão fazê-lo, e a classe não é unida para se defender", afirma Ribeiro.
Embora o desenvolvedor pernambucano tenha participado de seis processos seletivos nas últimas semanas, ele já ouviu negativas de empresas locais. Outros quatro processos estão em andamento.
Segundo Ribeiro, que já trabalhou como prestador de serviços terceirizado, sua predileção por uma vaga celetista visa buscar evitar problemas de comunicação com as contratantes. Além disso, a atividade de desenvolvedor(a) de software não se enquadra como MEI (microempreendor individual). "Se você quer trabalhar como pessoa jurídica, tem que se enquadrar corretamente para não ter problemas com a Receita Federal."
Em geral, os profissionais de informática com curso superior foram mais contratados do que os técnicos de nível médio. As altas foram registradas entre janeiro de 2020 e dezembro de 2022, respectivamente, 32,1% e 25,8%.
Ainda assim, a edtech Trybe, que oferece cursos de educação profissional, sinaliza confiança nas chamadas profissões do futuro ao manter seu modelo de sucesso compartilhado. Nessa forma de pagamento, os alunos só precisam arcar com as mensalidades após conseguir um emprego com salário superior a R$ 3.000.
De acordo com o analista do fundo de investimentos Avenue Guilherme Zanin, ainda há uma grande defasagem de profissionais técnicos nas empresas menores. "Esses negócios não têm tanto recurso quanto os grandes, mas gostariam de ter maior eficiência em seus processos", diz Zanin.
Foi o caso do engenheiro Nicholas Baraldi, demitido pela Rappi em janeiro, como noticiou a Folha. No início deste mês, ele conseguiu uma vaga em engenharia de dados na empresa InfoPrice, que oferece serviço de inteligência de negócios para empresas varejistas.

Tags:   Tech
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