Em agosto, antes do jogo contra o Liverpool, pela terceira rodada da Premier League, cerca de 10 mil torcedores se reuniram próximos ao Old Trafford para protestar contra os americanos. Essa insatisfação dos fãs não é de hoje. Em maio do ano passado, antes de uma partida também contra o Liverpool, centenas de fãs já haviam invadido o gramado do estádio para pedir que os donos fossem embora do United.
A maneira com que foi feito o acordo pela compra do clube é o principal motivo desse atrito entre os Glazers e os torcedores. A tensão, segundo Eduardo Carlezzo, advogado especializado em direito esportivo, é antiga por causa do formato com que foi feita a aquisição, entre 2004 e 2005, e que resultou em endividamento do clube, no chamado 'leveraged buyout'.
"Essa é a chamada compra alavancada, pela qual o adquirente de uma empresa não emprega capital próprio nesta operação, e sim, por exemplo, busca um empréstimo para comprar as ações e este empréstimo será posteriormente pago pela empresa adquirida e não por seu comprador", explicou.
O advogado ainda completou: "Foi isso o que ocorreu e que provocou a fúria dos fãs, pois endividou o clube e fez com tenha de pagar anualmente um alto valor em juros para cobrir o empréstimo feito por seus donos. Essa tensão cresceu de novo mais recentemente devido à escassez de troféus."
Nos últimos anos, o Manchester United não tem obtido resultados à altura de sua grandeza. Reconhecido como o maior campeão na Inglaterra, com 21 títulos, a última vez que o time ergueu a taça da Premier League foi em 2013, ano que marcou o fim da era Alex Ferguson. Além disso, já são quatro temporadas consecutivas sem nenhum troféu. As últimas conquistas aconteceram em 2016/2017, com a Copa da Liga Inglesa e a Liga Europa.
Depois que Ferguson anunciou sua aposentadoria, o time de Manchester não conseguiu manter a hegemonia no futebol inglês. Vários treinadores foram contratados neste período e nenhum deles fez o time atingir o patamar esperado pelos torcedores. Ao todo, foram quatro técnicos demitidos: David Moyes, Louis van Gaal, José Mourinho e Ole Gunnar Solskjaer.
Mesmo com toda a crise, o Manchester United ainda é considerado como um gigante do futebol mundial. De acordo com a Forbes, o valor do clube em maio de 2022 era de US$ 4,6 bilhões (cerca de R$ 22 bilhões). A receita no ano passado, segundo a consultoria KPMG, foi de US$ 636 milhões (R$ 3,3 bilhões). Em contrapartida, a dívida líquida, revelada em março no relatório financeiro trimestral mais recente, é de 496 milhões de libras (aproximadamente R$ 3 bilhões).
Armênio Neto, especialista em geração de receita na indústria esportiva, explica porque a imagem do gigante inglês ainda é tão valiosa no futebol. "A construção da marca Manchester United é resultado de uma estratégia de décadas, apoiada na expansão global da Premier League. Portanto, não se derruba o valor de uma marca como essa do dia para a noite. Ao mesmo tempo, podemos observar o surgimento de concorrentes que, combinando performance em campo a estratégias globais de crescimento, podem chegar a valer tanto ou mais que este clube no médio prazo."
Para reverter este cenário de crise e abafar a crítica dos torcedores, na última janela de transferências houve um investimento pesado em contratações. O United gastou mais de 150 milhões de libras em dois nomes badalados: o volante Casemiro, multicampeão com o Real Madrid, e o brasileiro Anthony, um dos jogadores mais promissores do mundo. Mas ainda não sabe o que fazer com Cristiano Ronaldo, que procurou clube antes da temporada, permaneceu no United por falta de opção e agora a imprensa inglesa volta a anunciar sua saída em janeiro.