Fonte: Agência Senado
Na data de aniversário de 11 anos do Código Florestal, o debate acerca da regulamentação do Mercado Brasileiro de Redução de Emissões (MBRE) levanta questões cruciais como a liquidez, o esquema de governança e a segurança jurídica do mercado de crédito de carbono. A audiência pública, promovida pela Comissão de Meio Ambiente (CMA) ontem quinta-feira (25), foi destinada a instruir o Projeto de Lei (PL) 412/2022 e demais matérias que tramitam em conjunto para a definição do marco legal.
Pelo PL 412/2022, empresas ou atividades poderão neutralizar suas emissões de gases que provocam o efeito estufa a partir da compra de créditos de iniciativas “verdes”. Tramitam em conjunto o PL 2.122/2021, do senador Weverton (PDT-MA); o PL 3.606/2021, do senador Veneziano Vital do Rêgo (MDB-PB); o PL 4.028/2021, do senador Marcos do Val (Podemos-ES); e o PL 1.684/2022, do senador Jader Barbalho (MDB-PA). As proposições tratam da mesma matéria, ao prever a regulamentação do mercado brasileiro de redução de emissões de gases de efeito estufa (GEE).
Presidente da CMA e relatora do PL 412/2022, a senadora Leila Barros (PDT-DF) disse que o Brasil sinaliza de forma muito negativa de que lado está na questão ambiental.
Ela lamentou o fato de a Câmara dos Deputados ter aprovado com alterações, na quarta-feira (24), a MP 1.150/2022, que trata de prazo de regularização ambiental, reinserindo regras sobre supressão da Mata Atlântica, antes excluídos na deliberação no Senado.
Sabemos que é um dos biomas [ ] mais afetados em termos de exploração, de desmatamento, e nós aqui, enquanto senadores, fizemos o nosso trabalho, mas infelizmente houve essa reviravolta dentro da Câmara. O trabalho agora está com o governo federal.
O senador Confúcio Moura (MDB-RO) também criticou a alteração na Câmara e salientou que o Brasil está atormentado com o desmatamento, “o que tem deixado o país exposto nos últimos seis anos”.
Gostaríamos de segurar o desmatamento e ter uma compensação para os produtores para deixar a floresta em pé. [ ] O mundo está eufórico com tudo isso, a politica ambiental está no cenário e o Brasil oferece ao mundo o que há de melhor, com mais de 55% das florestas em pé — disse o senador.
Quanto ao mercado de carbono, Confúcio salientou que o mercado voluntário trabalha com valores muito baixos, o que torna primordial regulamentar para que haja maior retorno.
Subsecretária de Desenvolvimento Econômico e Sustentável do Ministério da Fazenda, Cristina Reis afirmou que a regulação do mercado de carbono é um dos caminhos da sustentabilidade com inclusão.
Ao senador Zequinha Marinho (PL-PA), ela afirmou que entre as prioridades fazendárias, o novo arcabouço fiscal e a reforma tributária vão possibilitar o planejamento para a transformação ecológica, que o governo nomeia de Pacote Verde.
A transformação ecológica é uma visão de mudança de paradigmas. É mais do que uma transição, considera todos os setores econômicos e valoriza o meio ambiente e as pessoas — afirmou a gestora.
Além do mercado regulado de carbono, o governo também trabalha com a emissão de títulos verdes sustentáveis e a taxonomia de sustentabilidade, a partir da definição de conceitos e ativos sustentáveis.
A gente deve ter certeza que o nosso sistema brasileiro é uma meta, pode ser uma referência mundial e pode gerar receita para outras políticas nessa visão de descarbonização.
Diretora do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS), Viviane Romeiro confirmou que a agenda de mercado de carbono é complexa, assim como o instrumento de precificação.
A gente esbara em complexidades técnicas, somadas às complexidades políticas.
Mas, para a diretora, estamos um momento propicio da política, “nessa transversalidade, para termos um marco regulatório robusto para a COP-28” (Conferência do clima da Organização das Nações Unidas).
Entre os grandes desafios para essa agenda, estão, segundo Viviane, a definição da natureza jurídica, estabelecendo como as licenças e os créditos de carbono seriam entendidos como ativos financeiros; a implementação gradual, especialmente com relação à agricultura, além de questões tributárias, a definição do agente implementador e estabelecer se o sistema seria único ou independente.
Desde 2009, essa agenda não estava na pauta e desde 2021 vemos um conjunto de iniciativas de que a agenda climática deixa de ser ambiental e passa a ser de desenvolvimento.
A Confederação Nacional Indústria (CNI) escolheu para consolidar uma economia de baixo carbono 16 ações organizadas em quatro eixos: transição energética, mercado de carbono, economia circular e conservação florestal.
O gerente-executivo de Meio Ambiente e Sustentabilidade da CNI, Davi Bomtempo, expôs que a entidade defende um mercado de carbono sob a ótica do Cap and Trade, “em que é definida uma quantidade máxima de emissões de gases de efeito estufa aos agentes regulados e são emitidas permissões de emissão equivalentes”. A CNI defende ainda uma “governança robusta”, em que o setor privado esteja inserido.
O mercado regulado não é só uma solicitação da indústria, mas uma convergência de setores.
Coordenadora do Grupo de Trabalho de Crédito de Carbono da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima), Aline Ferreira salienta que a preocupação é bastante voltada para a questão da liquidez do mercado de carbono.
Aline Ferreira enfatizou que o mercado regulado precisa de parâmetros e é preciso fazer com que ele “converse com [mercado] o voluntário’, o que pode acontecer, segundo a coordenadora, a partir do atendimento dos requisitos de certificado, previsto no PL 412/2022.
Precisamos dessa padronização para trasladar o voluntário para o regulado.
A representante da Anbima afirmou que “a questão da natureza jurídica é o grande definidor do sucesso desse mercado”. Ela defendeu ainda que “o Brasil é olhado como um grande potencial operador desses créditos” e que se pode trabalhar para que investidores estrangeiros enxerguem esse mercado.
Diretor de Economia e Inteligência Setorial da União da Indústria de Cana-de-Açúcar e Bioenergia (Única), Luciano Rodrigues disse que se preocupa com a exclusão sumária de uma possibilidade no futuro de integração dos programas RenovaBio — que visa expandir a produção de biocombustíveis e trabalha pela descarbonização — e o que está sendo criado.
É importante que o instrumento legal não vede essa possibilidade no futuro. Nos preocupa quando a gente vê no texto um artigo excluindo de maneira sumária.
Também é esperado, segundo Rodrigues, que haja uma estrutura tributária isonômica entre o RenovaBio e o que está sendo discutido.
Nos últimos três anos, de acordo com Rodrigues, foram contabilizadas 90 milhões de toneladas de CBios (crédito de carbono emitidos pelos produtores de biocombustíveis), que movimentaram R$ 6,5 bilhões.