Tendo por base esta premissa, começou nesta segunda-feira (26) a Semana Nacional de Políticas sobre Drogas, com o tema Política sobre Drogas: Foco nas Pessoas. O evento é promovido pela Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas (Senad), do Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJ).
Segundo a secretária da Senad, Marta Machado, a ideia do encontro, que reúne em Brasília diversos especialistas no assunto, é pensar a prevenção ao uso de drogas por meio de "políticas voltadas a pessoas", tendo como foco demandas e vulnerabilidades, em um cenário problematizado por impor obstáculos de acesso a serviços, Justiça e direitos por pessoas que usam drogas, suas famílias e comunidades."Falamos, portanto, de uma política sobre drogas que lida com a questão do uso problemático de substâncias como uma questão de saúde, de desenvolvimento social e humano, de direitos humanos, e de equidades racial e de gênero", explicou a secretária.
Na avaliação de Marta Machado, é necessário olhar de forma integrada para as necessidades das pessoas, com foco no respeito à autonomia, no acesso à informação qualificada, na ampliação do acesso a serviços da rede de saúde e de proteção social, no acesso a direitos, e na promoção de justiça social e de justiça racial.
"As ações para prevenir tanto o uso das drogas quanto um envolvimento com tráfico passam pela ampliação do acesso à moradia; pelo acesso a trabalho e renda; por menos discriminação e mais direitos; por menos racismo e mais justiça racial; por menos violência e mais prevenção; por menos preconceito e mais ciência", argumentou a secretária.
Metodologias
Iniciativas similares, segundo ela, já foram implementadas em 2013, durante o governo de Dilma Rousseff, por meio de "alguns programas de prevenção, com metodologias validadas internacionalmente, adaptadas para o Brasil, e com a aplicação monitorada para continuar o aperfeiçoamento"
"A Senad, então, apoiou esse movimento que, infelizmente, foi interrompido", disse ao anunciar a retomada das iniciativas de prevenção e seu "robustecimento" em torno de um Sistema Nacional de Prevenção que consiste em um plano de ação a ser aplicado, inicialmente, em 163 municípios prioritários, no âmbito do Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (Pronasci).
Esses municípios que serão o ponto de partida do programa são responsáveis por 50% dos homicídios cometidos em território nacional. "Nossa meta é a de [posteriormente] disseminar isso por todo o país", acrescentou.
Entre as medidas previstas está a de qualificar informações e profissionais que atuam em prevenção, além da possibilidade de replicação.
"Trata-se da constituição de uma rede de pesquisadores, gestores e especialistas para troca de informações e contínuo monitoramento das políticas de prevenção", detalhou a secretária.
O sistema de prevenção contará também com uma plataforma virtual que funcionará, segundo ela, como banco de dados, onde gestores e educadores poderão encontrar os materiais dos programas.
Possibilitará também a troca de conhecimentos e boas práticas: "consideramos essencial que os materiais sejam democratizados, com acesso livre e gratuito". O piloto desse programa será a rede escolar do Ceará.
Unodc
Representando o Escritório sobre Drogas e Crime das Nações Unidas (Unodc), Elena Abbati disse que, segundo relatório da entidade, apenas uma em cada cinco pessoas com transtorno associado a uso de droga recebe tratamento. "As barreiras para acesso ao tratamento são múltiplas", disse.
Ela explica que, entre os problemas observados para acesso a tratamento, está o fato de as pessoas usuárias de drogas terem de lidar com o estigma e com a discriminação, o que pode comprometer ainda mais a saúde física e mental, além de dificultar o acesso a direitos e serviços.
"Por isso a campanha do Unodc deste ano [People First] ressalta a importância de colocar as pessoas em primeiro lugar, para fortalecer a prevenção", acrescentou ao defender, também, "práticas baseadas em evidências e em uma cultura de respeito e empatia".
Marta Machado defendeu um redirecionamento dos "recursos repressivos do Estado", visando, em vez de repressões à população, o "estrangulamento patrimonial das organizações criminosas". O alvo, segundo ela, devem ser os "elos mais fortes e de comando" na cadeia do tráfico de drogas.
"Olhamos aqui para um cenário de violência institucional causado por anos de incentivo ao modelo de repressão bélica, altamente ineficiente, e que também tem sido responsável pela vulnerabilização de direitos de pessoas que vivem em territórios periféricos e conflagrados pelo tráfico de drogas", argumentou.
"É, portanto, preciso ter foco nas pessoas, para que a força bruta do Estado deixe de atingir pessoas inocentes – muitas delas, crianças. A maioria, negras e periféricas que sofrem os efeitos colaterais dessa guerra", acrescentou.