Para celebrar a data, relembrando o fato de que a primeira imagem científica do Webb, um campo profundo de galáxias, foi apresentada em 11 de julho do ano passado em um evento com o presidente Joe Biden, na Casa Branca, a Nasa divulgou nesta quarta (12) uma nova imagem produzida pelo telescópio espacial e, desta vez, o alvo é mais próximo de casa -em mais de um sentido.
Trata-se do complexo de nuvens de Rho Ophiuchi, nebulosa localizada a 390 anos-luz da Terra, na constelação do Ofiúco. É o mais próximo berçário estelar conhecido, e a imagem do telescópio espacial é de tirar o fôlego. Em primeiro lugar, por revelar cerca de 50 estrelas, a maioria do tamanho do Sol ou menor, em processo de formação, com detalhes jamais antes capturados.
Graças a seu espelho primário de 6,5 metros e um olhar aguçado no infravermelho, o Webb revela um misto de estrelas formadas e casulos envolvidos em poeira, alguns deles expondo os sinais de discos protoplanetários -indicando que, junto com as estrelas, estão se formando planetas. Ao centro da imagem, está a maior das estrelas recém-nascidas, significativamente mais massiva que o Sol e capaz de, com sua radiação ultravioleta, abrir um bolsão vazio em meio à nebulosa, varrendo os gases para longe.
Para além da beleza (não há como errar quando o alvo são nebulosas), o que se vê é um cenário auspicioso não só para o estudo de formação de novas estrelas, mas para a compreensão de como o Sol e sua família de planetas vieram a surgir. Em alguma nuvem como essa, há 4,6 bilhões de anos, o Sol estava se formando. Embora a imagem em si revele o estado dessa nebulosa há apenas 390 anos (já que esse é o tempo que a luz levou para viajar de lá até aqui), seu alcance na direção da compreensão do passado é muito mais amplo.
O estudo de nebulosas que servem de berçários estelares já não é mais o mesmo depois do Webb. Mas essa é apenas uma das áreas de pesquisa que o telescópio espacial desenvolvido a um custo de US$ 10 bilhões por americanos, canadenses e europeus (reunidos nas agências Nasa, CSA e ESA, respectivamente) já começou a transformar, para melhor, em seu primeiro ano de observação científica.
"A amplitude científica que o Webb é capaz de explorar fica realmente clara agora, tendo um ano de dados vindos de alvos espalhados por todo o céu", diz Eric Smith, vice-diretor de pesquisa da divisão de astrofísica da Nasa e cientista envolvido diretamente com o telescópio espacial. "O primeiro ano de ciência do Webb nos ensinou não só novas coisas sobre nosso Universo, mas revelou que as capacidades do telescópio são ainda maiores que as nossas expectativas, indicando que futuras descobertas serão ainda mais incríveis."
SISTEMA SOLAR
Não é o principal destaque, nem o motivo principal para a construção do Webb, mas o telescópio brilhou neste primeiro ano no campo da ciência planetária, que envolve o estudo de objetos do nosso próprio Sistema Solar. O Webb não pode ser apontado para Mercúrio e Vênus, os planetas mais internos, para não arriscar expor o espelho e seus instrumentos ao Sol, mas de Marte em diante tudo é jogo.
Neste primeiro ano, observações marcantes dos planetas gigantes gasosos foram realizadas. No infravermelho, ele vê detalhes que os outros telescópios simplesmente não conseguem captar. Um grande exemplo foram as imagens de Urano e Netuno, os planetas mais afastados.
"Em Netuno, não víamos alguns dos anéis desde a passagem da Voyager-2 por lá, em 1989", diz Macarena Garcia Marin, astrofísica da ESA e cientista envolvida com o telescópio. "Com o Webb, podemos ver todas essas características, temos mais dados, e os astrônomos estão procurando mais anéis, mais satélites e podem estudar com mais detalhes a atmosfera e a dinâmica desses planetas."
O equipamento também se mostrou mais versátil do que o esperado. De forma acidental, descobriu o menor asteroide já visto no cinturão entre Marte e Júpiter, com apenas 200 metros de comprimento. E fez uma observação que deixou os cientistas responsáveis embasbacados: o monitoramento, em tempo real, do que aconteceu ao asteroide Dimorfo após a colisão da sonda Dart com ele.
"Foi um desafio", define Jane Rigby, astrofísica do Centro Goddard para Voo Espacial da Nasa e cientista-sênior do Webb. "Ele não foi feito para rastrear um objeto que se movia tão depressa -era o triplo da velocidade máxima de deslocamento prevista para o telescópio-, e mesmo assim conseguimos rastrear a pluma de detritos saindo do asteroide quando ele foi impactado pela Dart."
Na prática, a tentativa redefiniu -para melhor- a capacidade de acompanhar objetos com deslocamento rápido pelo céu.
EXOPLANETAS
Saltando para fora do Sistema Solar, o Webb observou diversas estrelas nos mais variados estágios de sua vida, entre as quais as Wolf-Rayet, que são astros instáveis no fim de suas vidas, e as nebulosas planetárias, restos de estrelas que já morreram. O maior destaque, contudo, foi para o estudo dos exoplanetas, campo efervescente da astronomia que já conta com mais de 5.000 astros descobertos nas últimas três décadas.
"Estamos usando um bom tempo estudando exoplanetas", destaca Rigby. "O Webb não foi construído para observá-los. Esse objetivo foi adicionado meio que no fim, no espírito de 'vamos ver o que conseguimos'. Mas o Webb tem se revelado tão estável, os primeiros dados que obtivemos de exoplanetas simplesmente saltaram para nós -uau, aí estão as assinaturas das moléculas."
Um dos grandes usos do Webb se dá ao monitorar quando um exoplaneta passa à frente de sua estrela, causando um minieclipse. Parte da luz vinda dela passa de raspão pela atmosfera dele antes de chegar até nós, trazendo a assinatura dos gases que encontrou pelo caminho. E o telescópio apresenta uma qualidade sem igual, comparado a seus irmãos mais famosos, como o Telescópio Espacial Hubble. "Antes pegávamos talvez uma molécula. Agora pegamos um conjunto completo, água, dióxido de carbono, monóxido de carbono", diz Rigby.
Um dos principais alvos nesse campo estudados pelo Webb neste primeiro ano de observações foi o sistema Trappist-1. Localizado a 41 anos-luz da Terra, ele tem 7 planetas de porte terrestre, 3 dos quais na zona habitável -nem muito quente, nem muito fria- em torno da estrela, uma modesta anã vermelha bem menor que o Sol. A essa altura, já foram publicados resultados para os dois planetas mais internos, Trappist-1 b e c, que identificaram a ausência de atmosferas apreciáveis e temperaturas diurnas de cerca de 230°C e 110°C respectivamente. "Por enquanto temos resultados para os dois mais internos, e estamos trabalhando na caracterização dos demais", diz Marin.