O uso desse inseticida por via aérea é proibido. Um dia depois do despejo do agrotóxico, apicultores dos municípios de Sorriso, Sinop (MT) e Ipiranga do Norte (MT) registraram mortes instantâneas das abelhas em suas colmeias. Ao todo, 600 caixas foram contaminadas e perdidas pelos produtores.
"Foi um verdadeiro extermínio por conta da grande quantidade. E sabíamos que era o resultado de veneno que passaram em uma fazenda próxima", diz a vice-presidente da Associação de Apicultores e Meliponicultores do Vale do Teles Pires de Sorriso (Apis Vale) Clacir Signorini.
Cada caixa de colmeia chega a ter de 170 mil a 220 mil abelhas nesta época do ano, que é de alta na produção de mel, daí o cálculo da quantidade de abelhas mortas no episódio.
"Nós fizemos esse cálculo por baixo, pelo mínimo. Mas pode ser que o impacto seja muito maior, porque ainda tem as abelhas nativas e silvestres que ficam na natureza. Essas nós não contamos. Então o estrago pode ter sido até o dobro do que calculamos", afirma.
Signorini conta que as mortes das abelhas ocorreram em 18 e 19 de junho, período em que houve variação de temperatura na região, e que, no dia da aplicação do Fipronil, o vento forte levou o produto para cima, criando o que se chama de bolsão de ar. Com isso, o agrotóxico "viajou" para outras regiões dos três municípios.
A associação denunciou o caso para o Indea (Instituto de Defesa Agropecuária) de Mato Grosso, que iniciou as investigações no mesmo dia, com a coleta das abelhas mortas e vistorias em 22 fazendas da região.
O material foi levado para o Instituto Biológico do Estado de São Paulo para análise. O laudo confirmou que as mortes de mais de cem milhões de abelhas ocorreram em razão do agrotóxico Fipronil, que tem em sua bula a proibição de uso por via aérea.
Segundo Filipe Cavalcante Farias, engenheiro agrônomo e fiscal estadual de defesa agropecuária e florestal do instituto, a fiscalização foi rápida, o que facilitou a identificação do responsável pela morte das abelhas.
"Ao todo visitamos 22 propriedades na região e em uma identificamos os galões do produto vazios. Na pista de aviação, também encontramos resquícios do Fipronil. Nossas suspeitas foram confirmadas com o laudo oficial, que encontrou moléculas do produto nas abelhas e colmeias que foram levadas para análise", conta.
O proprietário recebeu multa de R$ 225 mil, e o processo foi encaminhado para o Ministério Público de Mato Grosso, para investigação de crime ambiental, e para o Conselho Regional de Engenharia e Agronomia de Mato Grosso, para apurar a conduta do engenheiro responsável pela autorização da aplicação do produto de forma ilegal. A reportagem não conseguiu contato com o produtor rural multado.
"Houve crime ambiental porque esse agrotóxico invadiu a cidade. Pessoas respiraram esse produto que tem um grau altamente tóxico, conforme sua bula. Como o Indea não investiga crime ambiental, encaminhamos para as autoridades competentes", explica o engenheiro.
A vice-presidente da associação de apicultores reforça que, além do impacto econômico, há também a preocupação constante com os impactos ambiental e de saúde pública na região, que é repleta de fazendas que utilizam agrotóxicos.
"É preciso urgentemente criar políticas de controle do uso de agrotóxico nessa região, porque nossas crianças estão adoecendo. O número de jovens com câncer tem aumentado na nossa cidade. E as autoridades têm que intensificar as fiscalizações para evitar que uma tragédia maior, a médio e longo prazo, ocorra", afirma.