Em um dos blocos, os dois foram provocados a apontar propostas para reduzir a defasagem escolar, agravada pela pandemia de covid-19. Como solução, Bolsonaro destacou que a ampliação do uso do GraphoGame está nos planos de governo.
O atual presidente acrescentou que a ferramenta permitia concluir o processo de alfabetização em apenas seis meses, sem entrar em detalhes de como isso funciona. As afirmações levaram alguns especialistas de educação a criticar publicamente argumento dado durante o debate, destacando que o letramento infantil pode durar uma média de três a quatro anos, a depender da metodologia de cada país.
"Como professor, coordenador do curso de licenciaturas na Faculdade de Educação da USP, eu afirmo: esse GraphoGame citado pelo Bolsonaro é a maior picaretagem e irresponsabilidade que existe na alfabetização de crianças", afirmou o professor da Faculdade de Educação da USP (Universidade de São Paulo) Daniel Cara.
"De quem adaptou o game para o Português, Augusto Buchweitz: "Sozinho o GraphoGame não irá alfabetizar a criança e não resolve esse imenso problema; não é esse o objetivo e nem poderia ser", escreveu no Twitter Priscila Cruz, presidente da ONG Todos Pela Educação.
O GRAPHOGAME E AS REGRAS DE ALFABETIZAÇÃO
O aplicativo GraphoGame é um jogo educacional para crianças com idades entre quatro e nove anos. Ele foi lançado com a proposta de "apoiar os professores, em atividades de ensino remoto, e as famílias, no acompanhamento das crianças no processo de aquisição de habilidades de literacia", diz a pasta em seu site.
No Brasil, as diretrizes do MEC (Ministério da Educação) até 2020 recomendavam que o ciclo de alfabetização ocorresse em três anos, nas primeiras séries do Ensino Fundamental.
Na época do lançamento da plataforma no Brasil, o então ministro da pasta, Milton Ribeiro, chegou a afirmar que a ferramenta tinha o objetivo de ajudar os professores no processo de alfabetização do ensino remoto, não substituir.
Ou seja, na prática seria um instrumento a mais de aprendizagem, não uma política pública educacional.
COMO FUNCIONA
O programa funciona como um game que pretende estimular a aprendizagem e a leitura de maneira lúdica.
A dinâmica é simples: em cada fase do jogo, várias letras aparecem na tela do dispositivo e o som de uma delas é pronunciado em áudio. A criança precisa acertar qual letra corresponde àquele som.
A cada acerto, uma pontuação. No fim de cada fase, é apresentado o índice de aproveitamento da criança. As etapas vão ficando mais complexas à medida que ela avança.
No Play Store - loja de app do Google - o índice de avaliação da plataforma é 4,2 (a nota máxima é cinco). Os comentários se dividem entre críticas e elogios.
No lado negativo, uma das reclamações recorrentes diz respeito ao som das consoantes, que parece ser diferente da pronúncia que os brasileiros costumam usar. "Em vez de ensinar o correto, deixa as crianças com bastantes dúvidas (...)", reclamou a usuário Safiry Santos.
"No início, achei que tinha encontrado o joguinho ideal pra minha pequena que ama aprender, mas de repente começa umas consoantes com a pronúncia completamente diferente e ela fica se confundindo a todo tempo, perguntando o que a voz falou (sic)", disse outra internauta, com o perfil de Luanda Nunes.
Por outro lado, há famílias com experiências positivas: "Minha filha tem atraso na fala, e o aplicativo ajudou bastante. O aprendizado das letras se torna mais fácil com o uso dos sons das letras ( técnica de fono). Me ajudou muito no período de pandemia", afirmou um usuário cadastrado como Ruv.
"Excelente App interface super intuitiva e muito fácil de usar meu filho aprendeu muito na pandemia parabéns aos desenvolvedores", comentou Derick Rodrigues.
Sobre as críticas, a pasta respondeu a Tilt em nota: "O MEC tem uma rotina de testes rigorosa e sempre que algum erro é detectado, isso é comunicado e imediatamente corrigido. Porém, os comentários dos usuários permanecem nas lojas virtuais, mesmo após eventuais correções que se façam necessárias".
APP É FINLANDÊS
A plataforma não é brasileira. Desde 2001, o aplicativo vinha sendo pensado por pesquisadores da Universidade de Jyväskylä e do Instituto Niilo Mäki, na Finlândia.
Em 2011, o programa foi lançado por lá, especificamente para crianças com dificuldades de encadear letras para formar palavras, disfunção conhecida como dislexia, que impede o desenvolvimento da leitura.
Após o lançamento, os desenvolvedores passaram a divulgar a ferramenta pelo mundo, e chegou a ser adotada em mais de 20 países como instrumento para auxiliar no processo de aprendizagem.
Em 2013, uma equipe de finlandeses chegou a promover um evento em São Paulo com especialistas em educação para apresentar uma versão do jogo em português e discutir suas funcionalidades.
Na ocasião, os professores da Finlândia defenderam que o aplicativo poderia ser utilizado tanto para crianças com transtornos como dislexia e discalculia, quanto para aquelas com dificuldades de aprendizagem ou que vivem em condições socioeconômicas difíceis.
A atual versão do GraphoGame no Brasil foi adaptada e desenvolvida por especialistas do Instituto do Cérebro, da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS).
FALTOU CLAREZA A LULA
Durante o debate, o candidato Lula não apresentou uma proposta objetiva. Citou apenas que as estratégias seriam definidas em conjunto com governadores e prefeitos a partir da realidade de cada lugar. Sua ideia é promover uma força-tarefa para que as aulas possam ser recuperadas.