Os vinhos chilenos, a partir do início da primeira década deste século, mudaram de sobremaneira. Antes tinham tipicidade, mantinham a integração com o terroir e procuravam limitar técnicas que os tornassem mais acessíveis a curtíssimo prazo. Infelizmente muitos produtores chilenos optaram por produzir vinhos globalizados, procurando alcançar um público que já dava sinais de vontade de se distanciar de vinhos com frutas muito extraídas, muito alcoólicos e que vinham, da safra do ano anterior, "prontos para beber".
Quando o Dom Melchior foi lançado houve uma recepção muito positiva pelo público-alvo, que seria o consumidor de alta renda e com um gosto bem formado no tocante aos vinhos, com viés europeu de Bordeaux, fundamentalmente. A partir de 2003, tal vinho passou a se alinhar com os vinhos potentes da Califórnia, que assim o são naturalmente, desligando-se da identidade tradicional do Chile.
Com os vinhos brancos ocorreu o mesmo e de forma ainda mais sensível. No espectro de consumo dos vinhos brancos, no começo do século XXI, o Chile não tinha tanta relevância e seus vinhos eram bem simples e fáceis de beber, até meio esquecidos em face da supremacia dos tintos chilenos. A grande virada que se deu foi com um branco chileno que vim a conhecer em 2006, o "Sol de Sol", produzido no Vale do Malleco pela Viña Aquitania, a partir da Casta Chadonnay. Era um vinho com identidade e personalidade, fruto de esmero na produção e respeito ao consumidor.
Ocorre que a qualidade não foi mantida safra a safra, seguindo uma tendência geral dos produtores chilenos, que passaram a produzir vinhos brancos alcoólico se com traços de frutas concentradas enjoativas, que remetiam para calda de abacaxi de modo a incomodar o consumo. Quando notei esta tendência abandonei os vinhos brancos chilenos – os tintos que eu já havia deixado de lado por conta da globalização, que os transformaram em suco de eucalipto com goiaba – e me socorri nos excelentes brancos argentinos e nacionais.
Ocorre que, para minha surpresa, me deparei com um branco chileno "old school": o Cordillera de Los Andes, produzido no Valle de Limari, pela espanhola Miguel Torres, a partir da Chardonnay. Trata-se de um vinho gastronômico, fresco, sem arestas e que remeteu a uma antiga agradabilidade perdida. É um vinho branco chileno, com DNA espanhol, que vale a pena ser conhecido e que, espero, sirva de exemplo para os viticultores do Chile. Salut!