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Entenda o porquê do fogo no Pantanal e como eventos climáticos intensificam as chamas neste ano

Mais de 3 mil focos de incêndio foram registrados no bioma entre 1º de janeiro e 25 de junho deste ano.

Por Midia NAS em 27/06/2024 às 06:26:22
Mais de 3 mil focos de incêndio foram registrados no bioma entre 1º de janeiro e 25 de junho deste ano. Ao todo, 661 mil hectares do território pantaneiro foram consumidos pelo fogo em 2024. Fogo no Pantanal em 2024.

Bruno Rezende

O Pantanal está em chamas. Neste ano, uma área equivalente a 680 mil campos de futebol já foi consumida pelo fogo no bioma que é conhecido pelas áreas alagáveis - que também estão secando. Diante de tanta fumaça, chamas e devastação, algumas perguntas são levantadas. O que está acontecendo no bioma? A temporada de fogo é normal? Quais os impactos que os focos de incêndio podem causar no Pantanal? É possível uma recuperação? O Pantanal pode desaparecer?

Nesta reportagem, você vai ler sobre a temporada de fogo que atinge o Pantanal todos os anos e o porquê deste período ser cada vez mais intenso e em intervalos menores.

A temporada de fogo no Pantanal

Incêndios: Pantanal tem pior junho de série histórica do Inpe

O bioma é considerado a maior planície inundável do mundo. Naturalmente, é esperado que o Pantanal tenha a temporada de água nos períodos mais chuvosos. Também espera-se a temporada de fogo, no período de seca. No entanto, devido à ação humana, as chamas que deveriam ser ocasionadas apenas por causas naturais, como raios, se intensificam por incêndios criminosos.

De acordo com a analista de Conservação do WWF-Brasil, Cíntia Santos, a temporada de fogo geralmente ocorre após o período de vazante, quando o bioma fica mais seco.

"O tempo de duração da temporada de fogo normalmente ocorre quando o período de cheia, que a gente chama de vazante, começa a escoar toda a água. E no período de vazante para seca, essa temporada do fogo ocorre, entre o final de junho a setembro", esclarece.

Mas porque o Pantanal é tão suscetível aos incêndios e que característica do bioma dificulta o combate ao fogo?

O biólogo e diretor de comunicação da ONG SOS Pantanal, Gustavo Figueirôa, explica que devido aos períodos de cheia e seca, o Pantanal acaba acumulando uma matéria orgânica altamente inflamável, a turfa, que concentra uma espécie de fogo subterrâneo.

"O que acontece, durante os períodos de secas e cheias nas estações da região, vão se criando camadas de matéria orgânica no solo. Imagina toda essa matéria acumulada ao longo de vários anos, é o ambiente propício para focos de incêndios. E uma característica do Pantanal que dificulta o combate aos incêndios, é o fogo de turfa ou "fogo subterrâneo", que queima sem que as pessoas percebam, nas camadas mais profundas de toda essa matéria orgânica".

Eventos climáticos adversos escancaram Pantanal ao fogo

Eventos climáticos adversos estão interferindo na temporada de fogo no Pantanal? A resposta é, sim. A pesquisadora Cíntia Santos, do WWF, explica que a forte seca que afeta parte do Brasil, juntamente com as mudanças climáticas e a expansão dos cultivos agrícolas, são os principais motivos do recorde de queimadas no Pantanal.

"Os períodos estão cada vez menores, ou seja, as temporadas estão antecipadas, e isso é resultado dos efeitos climáticos, juntamente com a interferência humana e uma seca prolongada".

De acordo com uma nota técnica do Laboratório de Aplicações de Satélites Ambientais da Universidade Federal do Rio de Janeiro (LASA-UFRJ), divulgada na segunda-feira (24), o Pantanal vive um dos momentos mais secos da história.

A região do Pantanal está sob regime de "seca persistente de intensidade extrema a moderada pelo menos nos últimos 12 meses", conforme a nota técnica.

De acordo com o documento, desde o final de 2023 e início de 2024, a região apresenta o maior índice de seca já registrado desde 1951, ultrapassando o ano de 2020 - que até o momento era considerado o primeiro do ranking de secas, considerando a umidade do solo na região.

Muralha de fogo e fumaça cerca cidade no Pantanal de MS

Os incêndios em 2024

Neste ano, de 1º de janeiro a 25 de junho, mais de 3 mil focos de incêndio foram registrados no Pantanal. Ao todo, 661 mil hectares foram consumidos pelas chamas (513 mil hectares em MS e 148 mil, em MT), segundo dados da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Os números já superam os registrados no mesmo período de 2020, quando houve recorde de devastação no bioma.

Especialistas explicam que o aumento exponencial dos focos de incêndio no Pantanal ainda em junho é causado pela antecipação da temporada do fogo, que chegaria só entre o fim de julho e agosto, e a exposição do solo seco.

"Esse é um dos piores momentos já registrados no Pantanal, em 2020 o fogo matou diretamente cerca de 16 milhões de animais, e esse ano isso pode ser pior", relata o pesquisador Gustavo Figueirôa.

Nesta semana, o estado de Mato Grosso do Sul decretou estado de emergência nas cidades atingidas pelos incêndios.

Para combater o fogo, equipes do Corpo de Bombeiros contam com equipamentos, auxílio de helicópteros e aviões e agora com o suporte de militares de outros estados que estão a caminho de Mato Grosso do Sul. Até esta quarta (26), seguiram para o bioma pantaneiro 42 militares do Distrito Federal e outros 40 do Rio Grande do Sul. A ação é coordenada pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP), que enviou agentes da Força Nacional para auxiliar no combate das chamas.

Mapa mostra onde estão concentrados os focos de incêndio no pantanal em junho de 2024

Arte/g1

Incêndios e queimadas: as causas do fogo

Estudo feito pela pesquisadora do Departamento de Meteorologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Renata Libonati, aponta que a atividade humana é a principal causa dos incêndios na região, representando cerca de 84%, seguido por 16% ocasionados por meios naturais.

De acordo com o Corpo de Bombeiros de Mato Grosso do Sul, inicialmente esses incêndios causados pela ação humana começam por uma queimada, que faz parte das técnicas tradicionais da agricultura familiar, em quase todo o Brasil, com o objetivo de limpar uma área para o plantio de culturas temporárias.

Fogo consume vegetação na região de Corumbá.

Bruno Rezende

No entanto, para a queimada não se transformar em um incêndio é preciso aplicar algumas técnicas de segurança, entre elas a construção de aceiros, e quando esses devidos cuidados não são executados, os incêndios são inevitáveis.

No Mato Grosso do Sul, a emissão de novas licenças para queimas controladas estão suspensas desde abril quando o governo decretou estado de emergência climática no estado.

Tem como fazer algo para impedir um fogo tão intenso?

Fogo destrói áreas que antes eram alagadas, no Pantanal.

Gustavo Figueirôa/Arquivo Pessoal

Algumas medidas de segurança e controle podem ajudar no combate dos incêndios no Pantanal, tais como a queima controlada, fiscalizações e multas, monitoramento, além de iniciativas governamentais voltadas à preservação do bioma, explica o pesquisador Gustavo Figueirôa.

"Para impedirmos que essa devastação ocorra todos os anos e cada vez pior, precisamos de um conjunto de ações para controlar todo esse fogo, e essas ações devem ser realizadas o ano todo, não só quando o bioma já está queimando".

Em Mato Grosso do Sul é adotada a queima controlada, uma técnica de manejo do fogo utilizada para queimar apenas a superfície da vegetação e evitar grandes incêndios durante as temporadas das chamas ou de seca.

Mas só esta ação não é suficiente. Em abril deste ano, Mato Grosso do Sul e Mato Grosso assinaram um plano integrado de proteção contra queimadas no Pantanal. Os dois estados se comprometeram a gerir um grupo de trabalho formado por equipes técnicas. O termo de cooperação para a proteção do bioma terá cinco anos de duração e prevê:

Criação de uma resposta e responsabilização a incêndios florestais;

Monitoramento da fauna silvestre;

Investimento em produção sustentável;

Investimento em turismo.

Desde 2020, os órgãos de fiscalização ambiental, já aplicaram R$ 53,8 milhões em multas por incêndios considerados criminosos no Pantanal, em 94 autos de infração, Mato Grosso do Sul. Cada auto de infração representa uma área queimada que pode compreender milhares de hectares.

O Pantanal corre o risco de desaparecer?

Corpo de Bombeiros atuam em diferentes áreas do Pantanal

CBMMS/ Reprodução

O bioma, que conta com 210 mil quilômetros quadrados, o equivalente à soma das áreas de quatro países europeus – Bélgica, Suíça, Portugal e Holanda, está perdendo a área alagada.

Novos dados científicos revelaram que o Pantanal tem se tornado um ambiente cada vez mais seco.

Um levantamento do Mapbiomas, divulgado nesta quarta-feira (26), aponta que quase 60% do Pantanal foi atingido pelo fogo nos últimos 38 anos. E em 2023, a área alagada ficou 61% abaixo da média histórica.

O levantamento levou em consideração a média histórica de 1985 a 2023. Conforme o MapBiomas, o Mato Grosso do Sul que possui 65% do território pantaneiro registrou uma perda de superfície de água de 274 mil hectares (-33%), sendo o estado com a maior queda do país. Na segunda posição está Mato Grosso, que perdeu 263 mil hectares (-30%).

"Infelizmente, o Pantanal está altamente ameaçado, e isso não é um alarme de cientistas, isso é comprovado cientificamente em fatos. A degradação das partes altas do planalto, que estão no cerrado, ou mesmo da Amazônia, que é o entorno, interferem bastante na dinâmica de produção das chuvas. Uma série de fatores juntos, sim, infelizmente, trazem uma ameaça enorme ao Pantanal que a gente conhece", disse a analista de Conservação do WWF-Brasil, Cíntia Santos.

A última grande cheia no bioma que abrange mais de 4.700 espécies, incluindo plantas e vertebrados, ocorreu há seis anos.

Incêndios já arrasaram 680 mil hectares do Pantanal

Veja vídeos de Mato Grosso do Sul:
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