A juíza May Melke Amaral Penteado Siravegna, da 4ª Vara Criminal de Campo Grande, recebeu denúncia ofertada pelo MPMS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul) e tornou réus Genis Garcia Barbosa, Eufrásio Ojeda, Abner Aguiar Fabre e David Cloky Hoffmam Chita, todos investigados na Operação Miríade.
A operação, deflagrada em junho de 2023, desmantelou esquema de fraudes no Detran-MS (Departamento Estadual de Trânsito). O esquema era basicamente esquentar documentação de veículos com restrições, em procedimentos que incluíam até vistorias fakes, para torná-los aptos a comercialização.
Genis Barbosa, Abner Fabre e Eufrásio Ojeda desempenhavam função de gerenciamento ou de fiscalização no Detran-MS. Eles teriam agido em conluio com o despachante David Glocky Hoffamam Chita.
O caso concreto da denúncia menciona pagamento de R$ 1 mil para a regularização do veículo. Considerando o histórico e as investigações, o MPMS sustenta que as inserções ilegais ocorriam com frequência e que compunham uma espécie de rede. A denúncia foi ofertada pelo titular da 29ª Promotoria de Justiça, Adriano Lobo Viana de Resende, no mês de maio. A decisão que tornou os investigados réus é de junho.
"Diante do exposto, considerando que o acusado não preenche os requisitos para proposta do acordo da não persecução penal, posto que as condutas foram praticadas contra a administração pública e possuem elementos que indicam conduta criminal habitual, recebo a denúncia ofertada neste autos pelo Ministério Público Estadual", traz trecho da decisão interlocutória.
Fraude no Detran-MS
Gênis Garcia Barbosa, um dos réus, foi gerente da unidade do Detran-MS em Rio Negro. A operação contava com um mandado de prisão preventiva, não cumprido. Genis chegou a ser considerado foragido, até a preventiva ser revogada e substituída por medidas cautelares, como tornozeleira eletrônica. Conforme o advogado Wilson Tavares, a defesa entendeu que o pedido de prisão foi ilegal.
Na ocasião da Operação Miríade, a defesa de Genis se pronunciou. "Como membro do sistema de Justiça criminal, a defensoria particular de G. G. B. (?) levada a efeito por Wilson Tavares Advogados Associados, esclarece publicamente que restará, ao fim e ao cabo, patente a inocência de ambos na respectiva ação penal, sendo porém vedado, neste momento, publicitar outros elementos de convicção, ante o sigilo decretado no inquérito e processo". A reportagem procurou o escritório novamente após o recebimento da denúncia, mas não obteve resposta. O espaço permanece aberto para manifestação.
Foragido
Já o despachante David Cloky Hoffamam Chita, foragido após implicação em operação policial como mentor de fraudes no Detran-MS, possui passado envolvendo quadrilha de roubo de veículos e falsidade ideológica. Ele também aparece no contexto da Operação Vostok, deflagrada em 2018 contra esquema de pagamento de propinas da JBS a autoridades estaduais.
Outra ação – a qual David teve absolvição na Justiça Federal – aponta contratação por R$ 12 mil para "limpar multas" que ultrapassavam os R$ 397 mil de caminhonete, comprada por empresário que foi flagrado em barreira da PRF (Polícia Rodoviária Federal).
O esquema seria o mesmo: o despachante agiria em conluio com servidores do Detran-MS para apagar irregularidades e emitir um documento falso. No entanto, o juiz federal Ney Gustavo Paes de Andrade absolveu David por falta de provas.
Vale ressaltar que David não possui condenação transitado em julgado. Ele foi descredenciado pelo Detran-MS após os escândalos.
Operação Miríade
Deflagrada em 29 de junho de 2023, a Operação Miríade cumpriu mandados em Rio Negro, Campo Grande, Sidrolândia e Miranda. A investigação começou após informações de que Genis, então gerente do Detran de Rio Negro, possuía diversos procedimentos administrativos em seu desfavor.
A justificativa também incluiu movimentações no sistema sem amparo legal, além de veículos com alterações de características supostamente fraudulentas. Verificou-se que os procedimentos suspeitos nem existiam, sob falsas alegações de extravios.
A Delegacia de Polícia Civil do município, com o apoio da Corregedoria de Trânsito do Detran-MS, constatou que as fraudes vinham ocorrendo desde 2021, em especial aquelas relacionadas à inclusão fraudulenta do chamado 4º eixo nas especificações do veículo.
O monitoramento de pessoas investigadas e obtenção de conversas telefônicas apontaram como o esquema criminoso funcionava, além de informações sobre pretensões de remoções ilegais de outros servidores e delegados que presidiam às investigações.
Com isso, chegou-se à identificação de ex-funcionário do Detran, que, mesmo exonerado dos quadros da instituição, agia com o grupo e era responsável pela captação e aliciamento de outros funcionários para a prática criminosa.
A ação contou com a participação de policiais civis das Delegacias de Rio Negro, Sidrolândia, Miranda, bem como da Corregedoria de Trânsito e da Delegacia Especializada de Repressão aos Crimes Relacionados à Atividade Executiva de Trânsito.
"Miríade", nome da operação, equivale a dez mil ou a um número grande e indeterminado, justamente pelas incontáveis operações fraudulentas identificadas ao longo da investigação.
Detran-MS
Na ocasião da Operação Miríade, o Detran-MS pontuou que a operação é continuação da apuração que iniciou há dois anos pela Corregedoria da Autarquia. Assim que os primeiros indícios de irregularidade surgiram e que foi constatada a prática criminosa, todo o material coletado foi encaminhado à Polícia Judiciária, que abriu inquérito policial.
Ainda consta na nota que os servidores ativos no Detran respondem pelos atos na Polícia Civil e que serão submetidos a procedimentos administrativos.