Trabalho do GAECO/MPMS leva à condenação de 2 policiais por "frete seguro" de cocaína

Dois policiais civis foram condenados à prisão e à perda da função pública em ação penal movida pelo Ministério Público de Mato Grosso do Sul (MPMS), em razão da descoberta de que usavam viaturas para o tráfico de cocaína, entre as cidades de Ponta Porã, fronteiriça ao Paraguai, e a de Dourados, segundo maior município do Estado.

Divulgação

Divulgação

Dois policiais civis foram condenados à prisão e à perda da função pública em ação penal movida pelo Ministério Público de Mato Grosso do Sul (MPMS), em razão da descoberta de que usavam viaturas para o tráfico de cocaína, entre as cidades de Ponta Porã, fronteiriça ao Paraguai, e a de Dourados, segundo maior município do Estado.  Essa modalidade é chamada de "frete seguro", pois os veículos carregados de entorpecente não eram parados nas estradas, justamente por serem da força de segurança pública.

O esquema foi investigado na operação Safe Shipping (Envio Seguro em português), sob responsabilidade do Grupo de Atuação Especial e Repressão ao Crime Organizado (GAECO). Além dos policiais, um terceiro réu, identificado como traficante, também foi condenado.

A sentença considerou os três culpados pelos crimes de tráfico de drogas, associação para o tráfico e lavagem de dinheiro.

As penas

Para os agentes de segurança pública, a pena de reclusão foi definida em 19 anos, 4 meses e 12 dias de reclusão, além de 2.126 dias-multa, e ainda a perda do cargo, quando o processo transitar em julgado. Para o outro envolvido, foi estabelecida reclusão de 19 anos, 1 mês e 18 dias de reclusão, com 1.994 dias-multa. Cada dia de multa é equivalente a um dia do salário-mínimo vigente à época dos fatos, o que dá em torno de R$ 43,00.

A denúncia do MPMS indicou quatro fatos criminosos contra os réus, a partir do trabalho investigativo da operação, detonado após informação de inteligência da Polícia Civil. Entenda abaixo:

Fato 1: Em 5 de setembro de 2023, no período matutino, em Dourados, foram recebidos, transportados e mantidos em depósito pelos réus 538,1 kg de cocaína, avaliada em R$ 40 milhões.

Fato 2: Entre janeiro de 2022 e setembro de 2023, nas cidades de Dourados e Ponta Porã, houve associação entre os policiais denunciados para praticar reiteradamente o crime de tráfico de drogas, com adesão de um novo membro desde abril de 2023.

Fato 3: Nos dias 14, 27 e 31 de julho e 4 e 8 de agosto de 2023, nas cidades de Ponta Porã e Dourados, uma viatura policial foi utilizada para práticas ilícitas.

Fato 4: De janeiro de 2022 a setembro de 2023, em Ponta Porã, foram ocultados e dissimulados valores provenientes do narcotráfico, movimentando-os no sistema financeiro nacional e convertendo-os em ativos lícitos, muitas vezes em nome de terceiros.

Explicação

Na peça acusatória, os policiais foram enquadrados no crime de peculato-desvio, em decorrência do uso do bem público para a atividade criminosa. Foram absolvidos, porém, devido a uma particularidade da legislação em prática no Brasil.

Pelas provas angariadas, eles usavam recursos próprios para o abastecimento, estratagema capaz de livrá-los de mais essa responsabilização criminal. É que existe jurisprudência indicando ser apenas uma infração administrativa, o uso do veículo oficial para tarefas fora do trabalho de policiamento.

Diante do entendimento já pacificado nos tribunais superiores, o juiz responsável, Marcelo da Silva Cassavara, absolveu os réus dessa imputação, sem deixar de anotar a prática do "frete seguro" como um dos elementos para apenar os condenados.

"Os denunciados desviavam o bem público, no caso a viatura policial Chevrolet/S10, placa RWA-2I11, para interesse pessoal, com ela perpetrando o gravíssimo ilícito, equiparado a hediondo, com o intuito de auferirem proveito patrimonial indevido (recebiam propina para receberem, transportarem e descarregarem a droga)", traz a sentença.

Pelas apurações, o lucro auferido com o tráfico de cocaína usando a estrutura pública chegou a R$ 960 mil.

"Assim fizeram por inúmeras vezes, pelo menos nos dias 14/07/23, 27/07/23, 31/07/23, 04/08/23, 08/08/23 e 05/09/23, privando a sociedade, que é destinatária de todos os bens públicos, daquele automóvel, além de utilizarem, ainda que não em sua totalidade, combustível custeado pelo Estado de Mato Grosso do Sul, para traficar drogas, proporcionando, ainda, com essa conduta reiterada, o desgaste desnecessário e prematuro da viatura (pneus, óleo, freio etc), tão necessária em importante região de fronteira, com altos índices de criminalidade", completa o texto.

É destacado ainda, pelo magistrado, o fato de que a delegacia onde a viatura estava lotada tinha poucos carros oficiais, ampliando a gravidade da conduta perante à sociedade.

Seguem presos

Os condenados permanecerão em prisão preventiva devido ao risco de fuga e para garantir a ordem pública. Foram confiscados bens obtidos com a vantagem financeira dos crimes:  Um Jeep Compass Limited 2023/2023, um Honda HR-V, uma Fiat Strada Ranch AT 2022/2022 e um Fiat Uno Way 1.0 2014/2015.

Além disso, foram confiscados mais de 80.000,00 que estavam com dois dos réus.