Circula nas redes sociais uma mensagem de que a faixa usada por Luiz Inácio Lula da Silva na cerimônia de posse neste domingo tenha sido fraudada. É #FAKE. O adereço que o presidente recebeu de um grupo de brasileiros em um ato simbólico é diferente da utilizada por Jair Bolsonaro quatro anos antes, em 1º de janeiro de 2019, mas ambas são autênticas.
"Até a faixa é uma fraude ! Alexandre de Moraes entrega faixa fake para o ladrão posar de presidente! Confira a diferença na imagem", diz a mensagem falsa compartilhada pela atriz Regina Duarte no Instagram.
Na terceira vez que assumiu a presidência, Lula vestiu a mesma faixa que nas suas duas posses anteriores, em 2003 e 2007. O item em questão remonta aos tempos de Fernando Collor de Mello e também foi usado por Dilma Rousseff, em 2015.
A faixa usada por Bolsonaro ao ser empossado em 2019 foi comprada pelo próprio petista. Ela também foi utilizada por Dilma, em 2011.
Quando o atual presidente assumiu pela primeira vez, em 2003, o adereço em uso havia sido adquirido por Collor em 1991, numa versão idêntica à anterior, que vinha em uso desde a ditadura.
O modelo que Bolsonaro usou foi encomendado no início do primeiro mandato de Lula, embora a compra só tenha sido concluída em 2007, após idas e vindas e críticas ao preço do item, que acabou saindo por R$ 55 mil nos valores da época.
Assim, a primeira presidente a tomar posse com a indumentária atualizada foi Dilma Rousseff, no início de 2011. Entre os dois mandatos da petista, entretanto, o item e seus complementos foram dados como desaparecidos, e ela voltou a exibir o modelo antigo depois de ser reeleita, em 1º de janeiro de 2015. Michel Temer, vice de Dilma que assumiu em 2016 após o impeachment, também fez aparições públicas com a faixa estreada por Collor.
Só que a versão mais recente acabou localizada posteriormente por auditores do Tribunal de Contas da União (TCU). Por isso, foi este o item entregue por Temer a Bolsonaro há quatro anos. De lá para cá, Bolsonaro só foi visto — em eventos como os desfiles de Sete de Setembro — com a peça comprada por Lula. Os dois adornos, o antigo e o mais recente, são mantidos dentro de um cofre durante quase todo ano, saindo somente, via de regra, para as solenidades do Dia da Independência (além, claro, das passagens de gestão a cada quadriênio).
"O presidente da República usará, a tiracolo, da direita para a esquerda, uma faixa de seda com as cores nacionais, ostentando o escudo da República bordado a ouro". Assim nascia, há mais de um século, a tradição da faixa presidencial. A norma consta no decreto 2.229, assinado em 21 de dezembro de 1910 por Hermes da Fonseca, oitavo dos 38 nomes que já presidiram o Brasil. O texto estipulava até mesmo as características do adereço, "cuja largura será de 15 centímetros, terminará em franjas de ouro de dez centímetros de largo e suportará, pendente do porto de cruzamento das suas extremidades, uma medalha de ouro".
A entrega da faixa do presidente que sai para o que entra, ainda que simbólica, também está prevista em um decreto que segue em vigor — desta vez, o de número 70.274, assinado em 1972 por Emílio Garrastazu Médici, terceiro presidente da ditadura militar. Diz o capítulo II: "O presidente da República receberá de seu antecessor a faixa presidencial. Em seguida, o presidente da República conduzirá o ex-presidente até a porta principal do Palácio do Planalto". O texto, no entanto, não dá caráter compulsório ao ato, tampouco prevê qualquer sanção para quem descumprir a tradição.
Com uma origem mais do que secular, é compreensível que, com o desgaste natural ao longo dos anos, novas versões da faixa sejam confeccionadas de tempos em tempos. Não há, porém, qualquer registro concreto sobre quantas faixas já foram feitas, nem a respeito do paradeiro das que vão sendo deixadas de lado.
Mas algumas delas, pelo menos, têm destino sabido. O item encomendado por Juscelino Kubitscheck, por exemplo, está em exposição no Memorial JK. Outra foi enterrada junto com Tancredo Neves, como conta José Sarney, que assumiu a Presidência no lugar do político morto em 1985.
Já uma das mais antigas histórias do folclore político brasileiro dá conta de que, depois que João Goulart foi derrubado pelo golpe militar, em 1964, Leonel Brizola, cunhado de Jango, fugiu para o exílio no exterior levando consigo o adereço. A lenda acrescenta que o fundador do PDT teria guardado o item até morrer, em 2004, na esperança de que, um dia, ele próprio viesse a usá-la. Mas Brizola, que disputou a Presidência duas vezes (1989 e 1994), desmentiu o relato em mais de uma ocasião.