Agência CNJ de Notícias
O engajamento dos tribunais contra a intolerância religiosa permitirá ao Poder Judiciário monitorar violações ao direito de crença que são levadas à Justiça. A nacionalização do monitoramento passa pelo trabalho de registro desses processos como crimes de intolerância religiosa de acordo com as Tabelas Processuais Unificadas do Poder Judiciário (TPUs). Criadas pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), as TPUs uniformizam a heterogeneidade dos milhões de conflitos judicializados no país.
Para classificar adequadamente os crimes motivados por intolerância religiosa, os tribunais devem atualizar seus sistemas de tramitação eletrônica de processos. Dessa forma, os servidores poderão cadastrar os processos que envolvam litígios dessa natureza específica sob o assunto “crime de intolerância religiosa”. Desde 2007, o combate à intolerância religiosa é lembrado no Brasil em 21 de janeiro. A relevância da temática levou o CNJ a criar, em janeiro de 2022, a Política Nacional de Promoção à Liberdade Religiosa e Combate à Intolerância no âmbito do Poder Judiciário brasileiro, com a Resolução CNJ n. 440.
Na norma, o CNJ define, para os órgãos de Justiça, os conceitos de liberdade religiosa, discriminação, tolerância, cultura, religião/doutrina. Além disso, elenca, como princípios da política pública, o “reconhecimento e a promoção da diversidade e da liberdade religiosa”; a “proposição de iniciativas, ações e políticas de enfrentamento à intolerância por motivo de crença ou convicção”; o “estabelecimento de estratégias de respeito à diversidade e à liberdade religiosa, e também do direito de não ter religião”; e a “adoção de medidas administrativas que garantam a liberdade religiosa no ambiente institucional, adotando medidas de incentivo à tolerância e ao pluralismo religioso entre os seus membros, servidores, colaboradores e público externo, sem comprometimento da prestação jurisdicional e rotinas administrativas”.
Desde agosto de 2022, as Tabelas Processuais Unificadas do Poder Judiciário (TPUs) foram atualizadas pelo CNJ com a inclusão de dois assuntos novos relacionados à intolerância religiosa: classificado sob o número 15129, quando crime de preconceito, ou 15136 quando ato infracional análogo a crime de preconceito. À medida que os tribunais atualizam seus sistemas conforme as aludidas tabelas, o Departamento de Pesquisas Judiciárias (DPJ/CNJ) poderá extrair estatísticas da Base Nacional de Dados do Poder Judiciário (Datajud) e, assim, quantificar a judicialização da intolerância religiosa no Brasil. A resolução incumbe o DPJ a coordenar e definir os parâmetros relativos à coleta dos “dados processuais relacionados à discriminação e intolerância religiosa”.
Mudanças realizadas ao longo das últimas décadas no texto da Lei 7.716/89, que criminaliza preconceito de raça ou de cor, passaram a abranger discriminação por motivo religioso. O artigo 3.º, por exemplo, prevê reclusão de dois a cinco anos para quem “impedir ou obstar o acesso de alguém, devidamente habilitado, a qualquer cargo da Administração Direta ou Indireta, bem como das concessionárias de serviços público”. A lei também criminaliza outras práticas cometidas sob o mesmo fundamento.
Com penas diferentes, também são passíveis de punição as discriminações praticadas no mercado de trabalho, em instituições como as Forças Armadas e cartórios, além de locais públicos, como os ambientes comerciais, escolares, esportivos, restaurantes e bares, entre outros.
O Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa foi instituído em homenagem à Ialorixá baiana Gildásia dos Santos e Santos, conhecida como Mãe Gilda, que fundou, em 1988, o terreiro de Candomblé Ilê Asé Abassá, próximo à Lagoa do Abaeté, em Salvador. A religiosa morreu em 2000, vítima do preconceito religioso. Em 2008, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) condenou os acusados, responsáveis pelos crimes de charlatanismo, entre outros, e reconheceu o direito dos herdeiros à indenização.