Por prestarem serviço voltado ao social e à saúde, os especialistas da Secretaria Nacional de Políticas Penais (Senappen), antigo Departamento Penitenciário Nacional (Depen), tinham alguma sensação de segurança. Acreditavam que seriam poupados em caso de atentados promovidos por facções criminosas, que desejam atingir o sistema rigoroso implementado nas penitenciárias federais. Contudo, em 2017, com o assassinato brutal da psicóloga Melissa de Almeida Araújo, 37 anos, em Catanduvas (PR), a realidade dos 114 técnicos e especialistas mudou.
Melissa foi executada por integrantes da maior organização criminosa de São Paulo e uma das maiores do Brasil, na frente do marido, um policial civil, e do filho, que tinha apenas 10 meses. A execução ocorreu dentro de um condomínio de classe média, onde a família morava. O imóvel fica a 55 km de Catanduvas.
Em 25 de maio de 2017, Melissa saiu do presídio de Catanduvas. Passou na delegacia onde o marido trabalhava e os dois seguiram para buscar o filho na creche. A família chegou em casa por volta das 18h. Apesar da psicóloga não notar, ela estava sendo seguida desde o início da manhã por criminosos que se dividiram em três carros roubados. Ela abriu o portão do residencial e, minutos depois, um dos carros chegou. Dois criminosos conseguiram entrar no condomínio e, armados com pistolas 9 milímetros, começaram a disparar contra ela.
O marido da servidora, policial, sacou sua arma e revidou o ataque. O agente foi atingido por oito disparos e matou um dos criminosos. Melissa saiu do veículo e correu para casa, mas os atiradores conseguiram alcançá-la. Ela morreu com dois tiros no rosto. O filho não se feriu. Um dos atiradores conseguiu fugir, mas foi morto logo depois em um confronto com policiais. Outros quatro envolvidos no crime foram detidos em operação das forças de segurança.
O crime bárbaro foi premeditado. Investigações apontam que ao menos três meses antes do assassinato, uma “equipe de levantamento de informações” chegou à região de Cascavel (PR). Nos celulares dos suspeitos, a Polícia Federal encontrou diversas fotos de casas e carros dos servidores do sistema. As provas indicam que Melissa não era a primeira opção, mas era a mais fácil. Durante o levantamento feito pela quadrilha, os criminosos chegaram a bater na porta de policiais penais para confirmar os endereços.
As apurações conduzidas pela PF concluíram que a facção tinha o objetivo de intimidar e desestabilizar os servidores que trabalham nas quatro unidades federais do país. O bando considera que os presos que integram o sistema federal sofrem opressão do Estado, uma vez que o esquema de segurança é rigoroso e não permite a entrada de drogas e celulares. A visita íntima também é proibida. Atualmente, há cinco penitenciárias federais no Brasil: Catanduvas (PR), Campo Grande (MS), Mossoró (RN), Porto Velho (RO) e Brasília (DF).
Antes de Melissa, dois policiais penais foram mortos a tiros:
- Catanduvas (PR): Alex Belarmino Almeida Silva morreu em 2 de setembro de 2016. Ele foi atingido por 23 tiros na cidade de Cascavel (PR).
- Mossoró (RN): o policial penal Henry Charles Gama Filho foi assassinado em 14 de abril de 2017. O agente foi executado em um bar da cidade.
Rotina perigosa
Ao lidar com as principais lideranças criminosas da América Latina, profissionais do sistema federal entram em modo sobrevivência. Muitas vezes, os próprios familiares não sabem da rotina de trabalho e com o que os servidores realmente atuam.
“Os criminosos presos por envolvimento na morte da Melissa foram encaminhados à Penitenciária Federal de Catanduvas, mesmo local onde ela trabalhava. Dessa forma, nós, especialistas que havíamos acabado de perder uma colega, tivemos de prestar assistência aos seus algozes. Foi doloroso”, desabafou um servidor que, por motivos de segurança, pediu para não ser identificado.
Assista a entrevista dada ao Metrópoles pelo servidor:
[VÍDEO – SERVIDOR DO DEPEN]
Júri
A 13ª Vara Federal de Curitiba começou a julgar, em 30 de janeiro deste ano, cinco réus acusados de envolvimento no assassinato. De acordo com a PF, Roberto Soriano, 49 anos, conhecido como Tiriça e apontado como número 2 na hierarquia da organização criminosa é o mandante do crime. O réu nega a versão da polícia.
Os presos Edy Carlos Cazarim, Wellington Freitas da Rocha, Elnatan Chagas de Carvalho e a mulher dele, Andressa Silva dos Santos, também passam por julgamento. A audiência já foi adiada cinco vezes pela Justiça Federal.
Quem são os acusados:
- Roberto Soriano: réu por homicídio triplamente qualificado e organização criminosa, além de tentativa de homicídio triplamente qualificado.
- Edy Carlos Cazarim: réu por homicídio triplamente qualificado e organização criminosa, além de tentativa de homicídio triplamente qualificado, posse de arma de fogo, munições e acessório de uso restrito, receptação dolosa e incêndio doloso.
- Wellington Freitas da Rocha: réu por homicídio triplamente qualificado e organização criminosa, além de tentativa de homicídio triplamente qualificado, organização criminosa, posse de arma de fogo, munições e acessório de uso restrito, e receptação dolosa.
- Elnatan Chagas de Carvalho: réu por homicídio triplamente qualificado e organização criminosa, além de tentativa de homicídio triplamente qualificado, posse de arma de fogo, munições e acessório de uso restrito.
- Andressa Silva dos Santos: ré por homicídio triplamente qualificado e organização criminosa.
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