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Como Xuxa se tornou ícone LGBTQIA+ e lotou de fãs gays navio em que comemora seus 60 anos


"Acho que 98% dos homens aqui do navio são gays", calcula Gabriel Kennedy, 35, profissional de higienização em um hospital de Barbacena (MG). Casado há 12 anos com outro homem, ele veio sozinho para a viagem por ser muito fã da apresentadora desde 1993, quando a mãe conseguiu comprar a primeira televisão para a casa da família.

"Só fechei quando saíram os pacotes mais baratos porque minha profissão não era compatível, já estava até conformado de não vir, até parei de seguir a Xuxa no Instagram para não ficar vendo as imagens e passar vontade", conta. "Quando consegui um valor mais acessível, eu parcelei de 18 vezes. Ainda não sei como vou pagar (risos)."

Na infância, Gabriel ganhou de presente da madrinha um vinil de Xuxa, mas não tinha vitrola em casa para tocar. Ele diz que a mãe conta que o menino andava com o álbum para cima e para baixo, e pedia para tocar quando entrava em alguma loja.

Na adolescência, quando a paixão pela apresentadora começava a esfriar, um fato acabou mudando as coisas. Pela internet, ele marcou um encontro com um rapaz de sua cidade e, ao chegar na casa dele, descobriu que se tratava de outro fã da Xuxa. Gabriel ficou impressionado com a coleção de discos que ele tinha, e os dois acabaram ficando bons amigos e compartilhando a idolatria pela loira.

CASAMENTEIRA

Já o agente de saúde João Neto, 43, e o professor de português Diego Sousa, 37, que moram em João Pessoa (PB), conseguiram levar o relacionamento a um novo patamar por causa de Xuxa. Inicialmente, os dois eram amigos, mas quando ficaram solteiros viram que a relação tinha virado algo além da simples identificação como fãs da apresentadora.

Eles já haviam se encontrado com Xuxa durante uma gravação do Caravana das Drags, que ela vai comandar ao lado de Ikaro Kadoshi no Prime Video. Na ocasião, eles chegaram a falar da história de amor iniciada por causa dela e tiraram foto. Ao dizerem que o próximo passo seria se casarem, eles contam que Xuxa respondeu que gostaria de ser madrinha.

Quando souberam do cruzeiro temático, compraram uma cabine e começaram a planejar como fariam isso acontecer. Compraram alianças (quadradas, como a que a própria Xuxa usa) e colocaram na mala. Eles não tinham garantia de que se encontrariam com ela, mas acabaram sendo sorteados para tirar uma foto com a apresentadora.

Foi nesse momento que eles pediram para que Xuxa abençoasse os anéis e a união, mas ela foi além e praticamente se tornou a oficiante de uma cerimônia relâmpago. Os dois trocaram as alianças ali mesmo, no palco do navio, e se consideram casados por ela.

ÍCONE INTERNACIONAL

Não foi só no Brasil que Xuxa teve uma grande influência sobre os gays. O publicitário argentino Ariel Nieto, 44, e o bailarino espanhol José Martínez, 45, vieram de Málaga, no sul da Espanha, onde moram, para ver a gaúcha. Os dois estão juntos há 20 anos.

Ariel conta que conhece a apresentadora desde os anos 1990, quando ela teve programa na Argentina. Ele a perseguia por toda Buenos Aires quando ela estava por lá para gravar, do aeroporto ao hotel. Já José conta que conhece Xuxa por causa do programa que ela teve na Espanha e diz que sempre gostou da brasileira. "A estética dela é muito icônica", afirma.

O argentino era quem estava mais preocupado desde que embarcou no cruzeiro porque não sabia se conseguiria passar alguns segundos que fossem na presença de Xuxa. Aflito, já no primeiro dia ele abordou a reportagem do F5 querendo saber como fazia para tirar foto com ela e ficou nervoso ao achar que o sorteio já tinha sido realizado. Por sorte, acabou contemplado, mas já estava ansioso para a apresentação de mais tarde, tanto que ainda de manhã estava escolhendo o lugar da plateia onde ficaria.

Outro que veio de longe foi o brasileiro Gustavo Paljakka, 48, que mora há mais de 30 anos fora do país. O comissário de bordo é casado com um britânico e disse que ameaçou se demitir caso a empresa não lhe desse licença para comparecer ao cruzeiro.

A ligação de Gustavo com Xuxa começou cedo, assistindo ao programa, mas ganhou contornos inusitados quando o mineiro de Uberaba (MG) tinha 12 anos e foi à plateia da atração dela na Globo, no Rio de Janeiro. Na época, ele ficou com o contato de um paquito (a versão masculina das paquitas, assistentes de palco), com quem ficou em contato frequente.

Quando ele tinha 14 anos, recebeu o convite para ir ao Rio, nas férias de julho, para assistir a uma nova gravação. Só que, três dias depois, na hora de voltar, avisou aos pais que não iria mais. A mãe disse que não mandaria dinheiro para ele se sustentar, e ele passou a morar de favor na casa de várias pessoas.

Ele conta que chegou a passar fome e a morar com uma travesti na favela da Rocinha (zona sul do Rio). "Minha mãe não sabia disso até hoje", afirma. Quando viu que o filho não voltaria mesmo, a mãe passou a mandar dinheiro para ele se virar. Porém, ele diz que passou meses à base de Kisuco e pão para poder ter dinheiro para pegar o ônibus para ir atrás de Xuxa aonde ela estivesse.

Gustavo integrou o grupo que se autointitulava "Turma da Porta", já que estava sempre na porta de qualquer lugar onde Xuxa estivesse, fosse no Teatro Fênix (onde ocorriam as gravações do programa) ou onde descobrissem que ela estaria. Ele diz que a turma não podia entrar em todas as gravações, para dar espaço a outras crianças, mas sempre ia em ocasiões especiais.

Este, aliás, não é o primeiro aniversário que ele passa com Xuxa. Por volta de 1992 (ele não lembra o ano exato), foi com outros fãs da apresentadora para o sítio onde ela estava no dia 27 de março. Quando começou a chover, ele conta que a apresentadora convidou todos os que estavam do lado de fora para vê-la a entrarem e pediu pizza para comerem. Eles ainda brincaram na piscina.

Mesmo depois que saiu do país, Gustavo não parou de acompanhar Xuxa. "Ouço 'Lua de Cristal' todos os dias, meu marido é britânico e até já aprendeu a tocar no piano", conta. Aliás, ele diz que conseguiu o emprego atual, na British Airways, de certa forma, por causa da Xuxa.

Reprovado na entrevista de emprego, ele diz que pensou: "O que a Xuxa faria?". Foi quando resolveu escrever uma carta para o presidente da empresa contando por que queria trabalhar lá, o que era seu sonho desde sempre. Mandou para o endereço dele, o da secretária e o do segurança do executivo. Dias depois, recebeu uma ligação dizendo que teria a chance de refazer a entrevista. Aí, sim, foi aprovado. Recentemente, ele foi promovido a chefe de cabine.

AFINAL, POR QUÊ XUXA VIROU ÍCONE GAY?

Perguntado sobre por que acha que Xuxa exerce tanto fascínio entre os gays, Gustavo diz que para a geração de homossexuais que cresceram nas décadas de 1980 e 1990 o programa da apresentadora era um oásis: "Ela, naquela época, já era nossa protetora; a gente se sentia em casa". "Não era sobre sexualidade, era um encontro comigo mesmo, para escapar do que tinha em casa", explica.

De uma família de militares, ele conta que chegou a ser mandado para um "centro de macumba" na tentativa de ter sua sexualidade transformada. "Já sofri muito", revela, emocionado. "Quando eu estava vendo o programa, meus primos passavam e me chamavam de viadinho. Era justamente quando estava com Xuxa que eu podia ser eu mesmo. Ela não é santa. Não existe santa na Terra, mas ela está pertinho", brinca.

"Eu sei o que é ser uma criança e não poder cantar, dançar e ter foto da Xuxa porque não era coisa de menino", concorda João Neto. "Mas a mensagem da Xuxa é de inclusão desde sempre. Ela abraça, acolhe e não vê diferença."

Ao longo das entrevistas, quase todos os entrevistados se arrepiaram (e mostraram o braço) ao falar de Xuxa para a reportagem. "A Xuxa sempre foi uma pessoa que não discrimina ninguém, ela prega o respeito", afirma Gabriel.

"Fora que ela é uma drag queen, né? Toda criança gay já quis brincar com aquelas roupas e aquelas botas dela. A gente nem sabia quem era RuPaul, a Xuxa que representava nós da comunidade gay, as travestis e a trans."

Para o argentino Ariel, a resposta também é por aí. "Ela sempre lutou pela tolerância e ensina que todos são iguais", comenta. "Sempre foi a favor das minorias e acredito que ela própria se sente parte dela. Ela poderia não estar nem aí, mas nunca deixou de ser agradecida, humilde, de ter respeito, amor e carinho por todos. Não é teatro, são 60 anos, é insustentável fingir que se é algo por tanto tempo."

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