Em entrevista à Folha nesta sexta-feira (5), ela conta que chegou a pensar em sair da creche e mudar de emprego, mas explica que o afeto das crianças e a confiança dos pais se tornaram um combustível para continuar. "Como a gente trabalha com criança e é espelho para eles, como a gente vai ficar toda hora chorando? Não dá."
Ela também afirmar ter encontrado apoio dentro da própria equipe. "Quando eu tenho um momento de fraqueza, tem outra colega ali que me ajuda. Eu tenho a solidariedade de quem viveu a mesma coisa. Se eu tivesse em outro lugar, as pessoas poderiam não compreender", diz ela
Simone só conseguiu pisar no parquinho onde ocorreu o ataque na quinta-feira (4). Há um mês, na manhã de 5 de abril, um homem de 25 anos pulou o muro da escola e caiu no pátio, onde crianças faziam uma roda de conversa sobre a Páscoa embaixo de uma árvore. Em uma ação que durou 20 segundos, ele matou quatro crianças e deixou cinco feridas. Os brinquedos já foram retirados, a árvore virou símbolo da busca pela paz e uma reforma ainda em andamento está modificando todo o lugar.
No momento do ataque, Simone estava em uma sala com mais duas professoras e quase 20 bebês de quatro meses até crianças de 3 anos de idade. Ao perceber o perigo ela trancou as crianças no banheiro.
"Uma das professoras viu o cara pular o muro. A gente deduziu que tinha um assalto no posto de gasolina do lado. Corremos para fechar as janelas e a porta. E colocamos as crianças no banheiro, porque o nosso trocador é bem grande. Eu fiquei na porta, ligando para PM, avisando que tinha um assaltante. Fiquei trancada lá. Só depois vi que era um massacre", contou Simone à Folha de S.Paulo, na noite de 5 de abril.
Ao longo do mês, Simone afirma ter pesadelos e que anda num estado de alerta permanente, mesmo quando não está na creche.
"A gente vai para qualquer lugar e procura uma rota de fuga ou se há algum lugar para se esconder", afirma.
Ela também conta que às vezes surge um sentimento de raiva, por terem vivido uma situação assim, e se questiona: "Sempre vêm muitas perguntas na cabeça. Por que isso tinha que ter acontecido aqui? Por que a gente viveu isso?".
Psicólogas ligadas à Prefeitura de Blumenau têm acompanhado a rotina da creche e atendido funcionárias, pais e crianças. Da equipe de mais de 20 pessoas da escola, quatro pediram desligamento. Outras duas ainda se recuperam para voltar ao trabalho.
Sobre o futuro, a professora afirma que pretende continuar na Cantinho. "Não me vejo fazendo outra coisa", diz. Paranaense de Quedas do Iguaçu, Simone se mudou para Blumenau ainda com 9 anos. Ela se formou em pedagogia no ano de 2018 e, desde então, trabalha na Cantinho.
Antes, chegou a trabalhar no comércio, mas pediu demissão para tentar um emprego na sua área. Entregou currículo no Cantinho, que fica no mesmo bairro onde ela mora com a família.
Ela é casada e tem dois filhos, um jovem de 21 anos e uma menina de 13, que frequenta a creche. "Ela ama ficar aqui, adora ficar com as crianças."
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