O Supremo Tribunal Federal (STF) marcou para os dias 19 a 25 deste mês a retomada do julgamento que pode abrir caminho para que haja entendimento das regras para contratos de trabalho e acabar com as dispensas sem justa causa.
O processo, que começou em 1997, estava parado desde outubro do ano passado, quando o ministro Gilmar Mendes fez um pedido de vista. Até o momento, oito votos já foram feitos e faltam apenas três: o do próprio Gilmar Mendes, de André Mendonça e de Nunes Marques (veja como votou cada ministro mais abaixo).
A decisão, porém, pode não vir neste mês. Isso porque o processo pode se estender por mais tempo, caso algum ministro faça um novo pedido de vista ou um destaque — quando há um pedido para o julgamento ser presencial e não no plenário virtual, como está marcado para acontecer.
Quando há dispensa com justa causa, segundo a legislação brasileira, o trabalhador perde o acesso a alguns direitos, como o pagamento de 13º proporcional daquele ano, pagamento de multa pelo empregador de 40% do Fundo de Garantia e não recebe aviso prévio.
Para ter justa causa, é preciso que a razão pela dispensa seja disciplinar, conforme consta no rol do artigo 482 da CLT. Não cumprir ordens diretas e abandono de emprego, por exemplo, podem gerar uma dispensa do tipo. "A lei é taxativa, tem que ser uma daquelas hipóteses. Se ocorrer, o trabalhador é considerado um alguém que deu motivo para perder o emprego", diz Carlos Eduardo Ambiel, sócio do Ambiel Advogados e professor de direito e processo do trabalho na FAAP/SP.
Porém, quando a dispensa não se enquadra em uma das hipóteses apresentadas no rol da Constituição, a dispensa é sem justa causa e o trabalhador tem direito aos benefícios citados.
A pauta do processo que se arrasta há 25 anos discute a aplicação de uma norma internacional que tem o poder de acabar com as dispensas sem justa causa no Brasil.
Esta norma, a Convenção nº 158 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), diz que o empregador tem direito a extinguir o contrato de trabalho, mas deve dizer o porquê de estar fazendo isso.
Essa norma foi ratificada pelo Brasil e entrou em vigor em 1996, mas foi denunciada alguns meses depois pelo então presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, e deixou de vigorar. Segundo FHC na época, não seria necessário aplicar a convenção no País.
O processo, que é uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIn) e foi movida pela Central Única dos Trabalhadores (CUT) e pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (CONTAG), questiona se o presidente teria o poder de denunciar uma norma que tramitou no Congresso Nacional e foi aprovada tanto pelo Poder Legislativo, quanto pelo Executivo.
No pedido da ação, as associações alegam que a competência para resolver sobre tratados e atos internacionais é exclusiva do Congresso Nacional, e não do Poder Executivo.
Caso a maioria dos votos dos ministros seja a favor da ação e eles entendam que o presidente não tem poder para, sozinho, denunciar uma norma que foi aprovada pelo Legislativo, a decisão abre espaço para que os conceitos de demissão com justa causa sejam ampliados, quando não há direito de indenização a trabalhador.
Isto porque, conforme o advogado Carlos Eduardo Ambiel explica, com a derrubada da denúncia de FHC sobre a norma internacional, esta passaria a vigorar novamente — mas ela apenas recomenda ampliar os casos em que uma dispensa é justificada. "Ela é uma convenção principiológica, para que os países tenham regras e leis internas que atendam esta lógica. Os países ainda precisam ter legislação sobre o assunto", aponta.
Ou seja, mesmo que a Convenção nº 158 da OIT, que diz que o empregador deve dizer o motivo de estar dispensando o trabalhador volte a ter regência no Brasil — diminuindo as situações em que há as dispensas sem justa causa — ainda é preciso que uma Lei Complementar seja aprovada ampliando o rol de hipóteses nas quais essas dispensas podem ser realizadas para haver uma justa causa, que deixarão de ser apenas por questões disciplinares e podem passar a ser por questões tecnológicas ou econômicas, por exemplo.
"Ao considerar como motivadas, permitiria que dispensas por motivos econômicos ou tecnológicos, por exemplo, não precisariam de indenização, o que não ocorre no Brasil", explica o advogado.
Oito ministros já votaram sobre uma das ações (ADIn 1.625) do tema. Os votos estão divididos em três vieses, sendo que a maioria entende que seria inconstitucional o presidente, sozinho, revogar a adesão à Convenção 158.
Como o processo está em andamento há 25 anos, a composição do STF mudou muito desde quando o processo entrou em voga. Dos oito votos já concedidos, cinco deles são de ex-ministros: Joaquim Barbosa, Ayres Brito, Nelson Jobim, Maurício Côrrea (relator) e Teori Zavascki.
Dos ministros que permanecem na Corte, já votaram Rosa Weber, Dias Toffoli e Ricardo Lewandowski, que se aposentou recentemente. Ainda faltam os votos de André Mendonça, Gilmar Mendes e Nunes Marques.
Os ministros Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Roberto Barroso, Luiz Fux e Cármen Lúcia não votam, já que ocupam cadeiras de ministros que já votaram e saíram.