"Através da Aula PĂșblica, tornou-se possĂvel contribuir de forma mais eficaz para a formação intelectual e cidadã dos alunos, incentivando a compreensão e o entendimento de questões polĂticas da sociedade brasileira a partir de dados da sua região. Este projeto, na medida do possĂvel, tem contribuĂdo para formar lĂderes, desdobrando-se na vertente do objetivo inicial: compreender e fortalecer o processo de transformação do espaço e sua real ocupação, além de melhorar os Ăndices de aproveitamento escolar", afirma o docente.
O inĂcio da empreitada, entretanto, contou com desafios: a própria comunidade não via com bons olhos os alunos saindo para campo, fotografando o bairro ou tentando entrevistar os moradores. "Às vezes, ouvĂamos na rua pessoas em rodinha perguntando: "quem é esse cara?", ou "lugar de aluno é na sala de aula!". Mas, a relevância de sair da sala e a minha persistĂȘncia fez com que nossos alunos reconhecessem a importância de preservar o espaço pĂșblico e de reconhecer, através dele, o seu papel na sociedade".
Em 2020, durante o primeiro ano da pandemia, um outro desafio veio à tona: com o isolamento social, o educador não podia levar os estudantes às experiĂȘncias presenciais. Surgiu a ideia de ir sozinho aos locais para fotografar e criar conteĂșdos virtuais que proporcionassem aos alunos a sensação de ter estado naquele lugar. "Como eu não podia levar meus alunos para as ruas, eu trouxe as ruas para as telas deles", destaca Paulo.
A iniciativa levou o professor a ganhar o PrĂȘmio Ibero-americano de Educação em Direitos Humanos Óscar Arnulfo Romero, uma iniciativa que reconhece o trabalho das instituições de ensino e da sociedade civil na defesa e promoção dos direitos humanos por meio da educação, promovido pela Organização de Estados Ibero-americanos para a Educação, a CiĂȘncia e a Cultura (OEI).
Paulo conta que, durante o isolamento imposto pelo surto sanitĂĄrio, as atividades tinham de ser lĂșdicas e envolventes. "Utilizamos jogos para prendermos a atenção dos alunos, e eles, felizmente, não se afastaram da escola", comemora.
Quanto ao prĂȘmio, ele diz que se sentiu fortalecido. "E corajoso a enfrentar todos os desafios que virão pela frente a partir do prĂȘmio, pois defender um projeto que representa o nosso paĂs em educação em direitos humanos, nos dĂĄ uma responsabilidade enorme, que o educador ele pode sim, transformar a nossa sociedade e lutar pelos seus direitos e deveres. Sempre olhando de forma positiva que um dia todos serão respeitados dentro da lei".
Um dos eixos de atuação da OEI envolve a promoção do bilinguismo. Os idiomas das nações ibero-americanas pautaram iniciativas pelo Brasil, como o Programa Ibero-americano de Difusão da LĂngua Portuguesa, criado para valorizar as duas lĂnguas oficiais – espanhol e portuguĂȘs – e potencializar o uso das lĂnguas em um modelo bilĂngue na região ibero-americana.
Para estimular estudos relevantes sobre o bilinguismo, que mostrem a importância geopolĂtica dos dois idiomas, o programa busca identificar, promover e reconhecer experiĂȘncias educativas realizadas por escolas da rede pĂșblica de ensino que se destacam no ensino bilĂngue e intercultural.
Assim surgiu o PrĂȘmio Cruzando Fronteiras, que reconhece as experiĂȘncias educacionais de interculturalidade e bilinguismo nas escolas da rede pĂșblica de educação bĂĄsica formal, englobando a educação infantil, o ensino fundamental e o ensino médio, e instituições de educação profissional técnica de nĂvel médio.
Um das instituições premiadas este ano foi a Escola Intercultural Brasil-México (CIEP 413), de ensino bilĂngue, localizada no bairro de São Gonçalo, Rio de Janeiro, que venceu na categoria Região Sudeste.
A instituição atua junto às comunidades carentes da região com atividades culturais e, na crise sanitĂĄria, em que muitos alunos abandonaram os estudos ou ficaram desmotivados, desenvolveu ações voltadas à mĂșsica, dança e teatro, colocando o aluno como protagonista em todos os projetos.
O sucesso das atividades culturais se refletiu no aumento de matrĂculas e na criação de turmas bilĂngues de 6Âș ano e resultou ainda no projeto Clube de Leitores, que envolve crianças desta série em aulas de espanhol, por meio de atividades lĂșdicas. O trabalho premiado - o "Club de Lectores" - foi organizado pela professora Sarah CorrĂȘa Carneiro, de 46 anos.
A professora conta que o projeto surgiu da ideia de estimular a leitura, aprimorar o vocabulĂĄrio e a pronĂșncia na lĂngua espanhola. O recurso utilizado foram revistas em quadrinhos da Turma da Mônica, na versão em espanhol.
HĂĄ 22 anos lecionando espanhol, Sarah conta que o reconhecimento do prĂȘmio a motivou como professora. "Nossa, nem acreditei quando soube do prĂȘmio. Isso me deu um gĂĄs para continuar e não desistir. Ter a certeza que estou no caminho certo".
Para outros educadores, ela deixa uma mensagem de incentivo: "Não desista! Ame o que faz. É difĂcil, é cansativo, às vezes não temos ajuda e ninguém acredita. Mas se vocĂȘ acredita, faça, realize e lute por ele. O importante é ver o resultado maravilhoso por algo que vocĂȘ idealizou e acreditou. E mais do que isso, colocando sempre o aluno como protagonista da atividade."
Na trĂplice fronteira entre Brasil, Argentina e Paraguai, mais um caso em que professores inovaram e conquistaram a atenção dos estudantes.
Em Foz do Iguaçu (PR), a arte de disseminar o bilinguismo e fortalecer os idiomas espanhol e portuguĂȘs rendeu à Escola Municipal Professor Pedro V. Parigot de Souza, a conquista do PrĂȘmio Cruzando Fronteiras, na categoria nacional, que reconheceu as prĂĄticas para fomentar o bilinguismo entre o pĂșblico infantil, que jĂĄ convive com essa realidade.
A unidade recebe crianças das cidades vizinhas que tĂȘm o espanhol como idioma materno.
"Por causa dessa caracterĂstica, funcionamos de forma bilĂngue, recebendo alunos da Argentina e do Paraguai, e, mais recentemente, da Venezuela. Por isso, pensamos em ações onde o aluno falante de espanhol é inserido em uma troca de linguagem com os estudantes que falam portuguĂȘs. A gente quer que o aluno nos ensine o idioma dele", explica a coordenadora pedagógica da instituição, Viviane Marques.
"Uma experiĂȘncia muito rica foi com os alimentos. A professora trouxe vĂĄrios tipos de milho, comparamos com o nosso, trabalhamos a pipoca, a polenta, a lenda do milho nas duas lĂnguas, foi uma experiĂȘncia muita rica para as crianças", destaca Viviane.
Funcionando em tempo integral, a escola investe na capacitação dos professores e oferece, no contraturno, aulas de espanhol. "No começo, a dificuldade foi a lĂngua espanhola ser entendida pelos professores, mas hoje todos estão comprometidos".
Além disso, os idiomas são trabalhados em atividades lĂșdicas com os alunos.
"Temos a semana do folclore, por exemplo, em que focamos em temas brasileiros e sul-americanos. Aqui, as crianças usam expressões em espanhol, e fazem essa troca, uma aprende o idioma da outra", comemora a professora, que tem como próximo desafio montar uma biblioteca bilĂngue na escola.