Segundo a CNI, se as regras já valessem para 2022, cerca de R$ 13 bilhões não teriam sido pagos em impostos à Europa
O Mercosul — bloco formado por Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai — discute a resposta do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ao acordo comercial com a União Europeia. A expectativa é que o grupo sul-americano envie o documento final aos europeus até o final deste mês. Se concluído, o tratado vai formar uma das maiores áreas de livre comércio do planeta, com quase 720 milhões de pessoas, cerca de 20% da economia global e 31% das exportações mundiais de bens.
Se as normas do acordo entre Mercosul e a União Europeia já valessem em 2022, cerca de R$ 13 bilhões em exportações brasileiras ao bloco não teriam pago imposto de importação, de acordo com estimativa da Confederação Nacional da Indústria (CNI).
Com o tratado, cerca de 95% de todos os bens industriais terão o imposto de importação para entrar no mercado europeu zerado em até 10 anos, sendo que mais da metade destes produtos — quase três mil — terão o benefício imediato na entrada em vigor do acordo, segundo a confederação.
O acordo do Mercosul com a União Europeia pode permitir que empresas brasileiras sejam mais competitivas e com maior espaço ao mercado europeu, além de favorecer instrumentos de diálogo e cooperação política em diversos temas, como mudanças climáticas e segurança pública.
A entidade que reúne a indústria nacional argumenta ainda que o acordo vai contribuir para a diversificação das exportações do país, fator considerado ideal para a reindustrialização brasileira. Isso porque o Brasil, ao longo dos últimos anos, deu prioridade às vendas para a China do que para os europeus.
Entre 2002 e 2022, a participação da União Europeia nas vendas brasileiras caiu de 23% para 15%, enquanto a da China cresceu de 4 para 27%. Segundo a CNI, 22% das exportações brasileiras à China foram de bens da indústria de transformação em 2022. Esses produtos responderam por 49% de tudo o que o país exportou para o bloco europeu no ano passado.
A finalização das negociações que resultaram no acordo inicial ocorreu em 2019. O próximo passo é a celebração do tratado pelas autoridades dos dois blocos econômicos. No entanto, os europeus apresentaram um documento adicional no primeiro semestre deste ano, o que atrasou as assinaturas.
Uma das questões apresentadas pela União Europeia é relacionada às compras governamentais. O trecho prevê que as empresas europeias poderão participar, em condição de igualdade, de licitações em países do Mercosul e vice-versa. As compras envolvem aquisições de bens, execução de obras e afins.
O governo brasileiro, porém, entende que a medida pode prejudicar a indústria nacional, já que o Executivo adquire produtos de diversas áreas, como saúde e agricultura. Em uma eventual participação de países europeus, o Brasil poderia ter a produção interna prejudicada ou não suficientemente estimulada.
“Se a gente abrir mão das empresas brasileiras para comprar das empresas estrangeiras, a gente simplesmente vai matar pequenas e médias empresas brasileiras e pequenos e médios empreendedores. Vamos matar muitos empregos aqui no Brasil”, disse Lula sobre o tema no mês passado.
Há entraves também nas questões ambientais. Os países da Europa querem a garantia de que a intensificação do comércio entre os blocos não vá resultar no aumento de destruição ambiental no Brasil e nas demais nações do Mercosul. Em contrapartida, o lado brasileiro é a favor de que não haja distinção na aplicação de eventuais sanções, ou seja, que ambos os lados sejam penalizados da mesma forma em caso de descumprimento.
O Mercosul foi fundado em 1991 e é a mais abrangente iniciativa de integração regional da América do Sul. Os países correspondem a 76% do território do subcontinente, o equivalente a 11,9 milhões de quilômetros quadrados. Os 270 milhões de habitantes equivalem a 62% da população sul-americana. Além disso, as nações detinham 67% do PIB da América do Sul em 2021.
As trocas comerciais dentro do bloco passaram de US$ 4,5 bilhões em 1991 para US$ 46,1 bilhões em 2022. O intercâmbio comercial do Mercosul com o mundo foi de US$ 727 bilhões no ano passado, dos quais US$ 398 bilhões são relacionados às exportações. Os principais destinos das vendas foram China, Estados Unidos e Países Baixos.
De acordo com o Palácio do Planalto, as exportações do Brasil para o Mercosul alcançaram US$ 21,9 bilhões em 2022, o equivalente a 6,5% das exportações brasileiras, contra US$ 18,9 bilhões em importações, ou 6,9%. Nesse período, os números geraram um saldo positivo de US$ 3 bilhões para o país.
Lula assumiu a presidência temporária do Mercosul no início de julho e permanecerá no cargo por seis meses. Do outro lado, o presidente da Espanha, Pedro Sánchez, assumiu o Conselho da União Europeia. Uma das prioridades internacionais do petista é destravar as negociações com os europeus, e a expectativa de membros do Itamaraty é que o tratado seja finalizado ainda neste ano pela boa relação entre os dois líderes.
Fonte: R7