Assim como Lula, âncoras da Globo não citaram o nome de Bolsonaro
F5-FOLHA DE SÃO PAULO
BRASÍLIA – William Bonner e Renata Lo Prete foram colegas de faculdade, mas suas trajetórias na televisão são muito diferentes. Ele entrou na Globo ainda muito jovem, em 1986, e, 10 anos depois, já estava na bancada do Jornal Nacional. Ela começou sua carreira na imprensa escrita, trabalhando em vários jornais –inclusive na Folha, onde chegou a ser ombudsman– e só estreou no vídeo em 2012, na GloboNews.
Com pinta de galã e uma voz firme e encorpada, Bonner parece ter nascido para as câmeras. Já Renata, que chegou à TV com quase 50 anos de idade, não era exatamente uma presença marcante em seus primeiros tempos na telinha. Mas, desde que assumiu a titularidade do Jornal da Globo em 2017, após a saída de William Waack, ela cresceu de forma exponencial.
Os dois apresentam telejornais distintos, mas já cobriram juntos alguns grandes eventos. No entanto, foi só na cobertura dos resultados das eleições presenciais, em outubro passado, que a dupla desenvolveu uma dinâmica própria.
Renata traz informações pontuais e embasadas, e consegue ser sóbria sem ser solene. Já Bonner assume uma persona ainda mais relaxada do que a vem exibindo no JN há alguns anos. Sorri muito e até faz piadas, mas mantém a objetividade profissional.
Esses dois estilos contrastantes funcionam muito bem juntos, como se viu na cobertura que a Globo fez da posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva neste domingo (1º). Renata e Bonner foram a Brasília, mas comentaram a cerimônia em um estúdio da emissora na capital. Os dois foram precisos, evitando a tentação de falar o tempo todo e encher o ar com palavras.
Brincalhão, Bonner chegou a sugerir uma enquete, para o público decidir se Renata pode apresentar o Jornal da Globo usando tênis. Em outros momentos, ele mal conseguia esconder sua alegria com o fato de Lula ser o novo presidente do Brasil.
Sim, a tão valorizada imparcialidade foi meio que deixada de lado. Mas dá para criticar um jornalista que se mostra aliviado com o fim de um governo que atacou o jornalismo durante quatro anos seguidos?
O finado governo, aliás, não foi citado pelo nome por ninguém. Em seus dois discursos, Lula fez duras críticas à gestão anterior, sem jamais mencionar seu antecessor. Bonner e Renata fizeram o mesmo. Foi de propósito? Ordens de cima? Jamais saberemos, mas serviu para ressaltar a ausência de Bolsonaro, que preferiu comer frango frito na Flórida a participar de um ritual democrático.
O ex-presidente, a bem da verdade, não fez a menor falta. Sua fuga para os EUA propiciou o momento mais emocionante desta tarde: a entrega da faixa a Lula por pessoas que representam a diversidade do povo brasileiro.
Havia uma criança, um operário, uma mulher negra, uma pessoa com deficiência e o lendário cacique Raoni. A comunidade LGBTQIA+, que tinha pelo menos um representante entre eles, foi esquecida nas duas falas de Lula. Renata e Bonner tampouco se deram conta dessa omissão.
Repleta de imagens emocionantes, com tomadas de tirar o fôlego e lindas intervenções musicais, a terceira posse de Lula foi exibida quase como um desfile de escolas de samba. Tanto William Bonner como Renata Lo Prete se deixaram contaminar pela grandiosidade do momento histórico, e passaram essa emoção para o telespectador.
A transmissão pela Globo foi interrompida pouco depois das 17h30, quando chefes de estado cumprimentavam Lula, Geraldo Alckmin (o mais eufórico de todos) e suas respectivas esposas. O Domingão com Huck precisava entrar no ar.
Do estúdio em Brasília, Renata e Bonner se despediram. Ele ressaltou sua satisfação em cobrir mais uma posse de um presidente eleito democraticamente. Antes, já havia criticado negacionistas e terraplanistas. Não precisou deixar mais claro de que lado está.