Tais ocorrências começaram a ser frequentes na região a partir de 1992. Já são 77 vítimas de ataques de tubarões na costa pernambucana desde então -com 26 mortes.
O jornalista, fotógrafo e surfista Alexandre Gondim relatou à reportagem que os episódios o fizeram recordar o "horror" vivido durante o início dos anos 1990.
"Comecei a surfar em 1984, vivi todo o terror de 1992, os sucessivos ataques. Parecia filme do Spielberg. Só se fala nisso nos grupos, todo mundo meio impactado. Meu sentimento foi como se tivesse voltado no tempo. É complicado demais. Sentimento geral, só se falou nisso hoje", afirmou.
A prática do surfe é proibida nas praias da região desde 1999. Cabo de Santo Agostinho, Jaboatão dos Guararapes, Olinda, Paulista e Recife são os municípios onde o esporte foi vetado. Em 2014, nado e mergulho também foram interrompidos nas áreas de risco.
CONSEQUÊNCIAS PARA O SURFE
Os ataques de tubarões provocaram uma série de consequências que abalaram o esporte e a indústria voltada para ele no Grande Recife.
"Em Recife, não pode surfar em canto nenhum, está tudo fechado. A gente teve que surfar cada vez mais longe. Antigamente era em frente de casa, agora é indo de carro. Prejudicou toda a indústria do surfe",, diz Gondim.
"O estado não tem mais tantos competidores fortes como era antigamente, todo o mercado em volta do surfe se prejudicou muito. Hoje se vai no shopping e quase não tem [loja] surf wear. Tirou a identidade do surfe, Recife não tem mais. Cada vez que aparece uma situação dessa, afunda ainda mais. Como é que uma criança vai chegar para os pais e falar que quer ser surfista?", pontuou.
Sérgio Murilo, surfista e presidente do Instituto Praia Segura, reforçou à reportagem que os episódios "praticamente interromperam" a prática.
"Não só a comunidade do surfe, mas toda a sociedade pernambucana foi impactada com os ataques. O clima de terror se instalou no Estado, tivemos um forte impacto econômico com reflexos muitos fortes. A partir do momento que foi proibido nas praias urbanas, o surfe praticamente foi interrompido no Estado, até porque os atletas se precisavam se deslocar para outras praias", detalhou.
TRAUMAS PARA OS SURFISTAS
Alexandre Gondim também contou que a notícia do ataque ao adolescente de 14 anos no domingo (5) o fez desistir de surfar em uma praia em que a prática é liberada.
"Estava me arrumando para ir surfar. Nem fui, fiquei impactado", disse.
Ele comentou que parou de surfar em praias da região desde antes da proibição, em 1999, após ter conhecidos que foram atacados.
Tiveram vários surfistas atacados, principalmente no começo. Um vizinho que morava no meu prédio foi atacado. Comecei a ver muita gente próxima sendo atacado. O porteiro da academia onde eu treinava chegou a falecer após ser atacado em Piedade. Parou de surfar em Recife antes de proibirem de fato"
POSSÍVEIS MEDIDAS
Gondim criticou que, apesar de os episódios com tubarões já durarem três décadas em Recife, pouco foi de fato feito para lidar com o problema.
"A meu ver, tem muita forma de agir. O problema é que de 92 até agora a única ação feita foi colocar placa e dizer que não pode tomar banho. Isso não vai adiantar muito. Como vai fazer isso [interditar] em praias urbanas com litoral de 12 km? Vai colocar policiamento para tomar conta?", opinou.
O presidente do Instituto Praia Segura destacou que quatro linhas de atuação devem ser retomadas ou intensificadas na região para combater os ataques:
"Acreditamos que os tubarões possam, sim, estar passando por uma crise alimentar. Pelo fato de existir um canal profundo próximo às praias, eles acabam se aproximando e atacando, mas a carne humana não faz parte do cardápio alimentar dos tubarões. Deve ter havido algum fato novo, desconhecido, que tenha causado esses três ataques em um curto espaço de tempo", finalizou.