A carta, apócrifa, diz que residentes sem supervisão chegaram a cuidar de quatro salas cirúrgicas simultaneamente, sendo que "mesmo um formado não poderia, ética e juridicamente, anestesiar mais de um paciente". Pacientes neurocríticos foram erroneamente sedados, afirmam, com sevoflurano (medicamento que dá perda de consciência suave) em doses altas, o que "comprovadamente piora o desfecho neurológico pelo aumento da pressão intracraniana".
Os episódios envolveriam também crianças e recém-nascidos "anestesiados por assistentes que há anos não atuam em ambiente de urgência e emergência, e que podem incorrer em inúmeros erros de medicação e condutas". Segundo os residentes, os casos ocorreram no Pronto-Socorro Cirúrgico do Instituto Central, referência estadual. É neste local onde são realizados os plantões dos estudantes de primeiro e segundo ano de residência médica. "É uma experiência ímpar para nós e para os residentes de especialidades cirúrgicas, o que nos prepara para atender pacientes extremamente graves, principalmente politraumatizados", diz outro trecho da carta.
Nesse contexto, residentes afirmam que pacientes são prejudicados, pois não recebem a "assistência necessária, correta e merecida". O texto diz que foram feitos relatos à preceptoria da Residência Médica e aos chefes do serviço, e que outras áreas do hospital, como enfermagem, teriam testemunhado as irregularidades.
TERCEIRIZAÇÃO
O Sindicato dos Médicos do Estado de São Paulo (Simesp) aponta que as reclamações dos médicos residentes do HC se tornaram mais comuns com o avanço da terceirização na contratação de anestesiologistas no local. Segundo a entidade, os anestesiologistas são profissionais que trabalham por plantão, sem prática laboratorial e que ficam à disposição para trabalhar nas cirurgias, o que facilita a terceirização.
Os representantes do sindicato também apontam um prejuízo educacional para os futuros médicos. Afirmam que os profissionais terceirizados não atuam como preceptores, com compromisso com o ensino, mas apenas como prestadores de serviços.
'Contratados são avaliados diariamente', afirma HC
O Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP (HC-FMUSP) afirma que as informações apontadas em carta apócrifa estão sendo checadas. Segundo a direção, o HC mantém quadro próprio de anestesiologistas, recentemente reforçado por outros profissionais de empresas terceirizadas para garantir a assistência à população, especialmente com a retomada dos procedimentos cirúrgicos eletivos após o período mais crítico da pandemia, em que estes tiveram de ser suspensos.
"As empresas contratadas são especializadas e avaliadas diariamente pela coordenação do HC, não havendo até o momento nenhuma evidência de queda da qualidade do atendimento prestado aos pacientes", diz o hospital. "O HC garante que todos os protocolos de segurança assistencial são adotados e o número de anestesistas é constantemente ajustado à demanda, prevendo que o profissional atenda um paciente por vez, conforme Resolução 2174/2017 do Conselho Federal de Medicina."
O centro médico paulistano é referência para todo o Estado de São Paulo e recebe casos de urgência e emergência, incluindo os pacientes transportados pelos helicópteros Águia da Polícia Militar.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.