De acordo com o documento, a chamada CPMI do Golpe deve iniciar a investigação pela atuação do então ministro da Justiça e Segurança Pública, Anderson Torres, em sua relação com a Polícia Rodoviária Federal (PRF) no segundo turno das eleições de 2022 e diante das "manifestações golpistas ocorridas nas rodovias nacionais logo após o resultado do pleito". Segundo o texto, isso não impedirá que novos fatos conexos possam vir a ser incluídos. Torres é acusado de usar operações da PRF para dificultar a locomoção de eleitores no Nordeste nos dias de votação.
Pelo plano de trabalho, em seguida, a investigação se concentrará na atuação de Anderson Torres como secretário de Segurança Pública do Distrito Federal (DF); nos acontecimentos dos dias 12 e 24 de dezembro; no acampamento na região do Quartel-General do Exército, em Brasília; no planejamento e atuação dos órgãos de segurança pública da União e do DF no dia 8 de janeiro.Também serão apurados "o apagão na execução das medidas de contenção"; as manifestações públicas e em redes sociais de agentes políticos contra o resultado das eleições; a relação do então ajudante de ordens do presidente Jair Bolsonaro, Mauro Cid, com pessoas envolvidas com os atos golpistas, e a atuação dos órgãos das Forças Armadas e sua relação com os acampamentos de manifestantes montados na capital federal.
Ao justificar o plano, Eliziane Gama argumentou que é preciso conhecer as ações que antecederam o dia 8 de janeiro e deram ensejo à invasão da praça dos Três Poderes. "O dia das depredações não começou à meia-noite de 8 de janeiro de 2023, mas muito antes, em uma sucessão de eventos de, para dizer o mínimo, exaltação de ânimos", afirmou a senadora maranhense.
O relatório apresentado dá destaque à investigação dos atos dos dias 12 e 24 de dezembro em Brasília. No dia 12, data da diplomação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), manifestantes puseram fogo em veículos e tentaram invadir a sede da Polícia Federal e, no dia 24, foi encontrado um artefato explosivo em um caminhão próximo ao aeroporto de Brasília.
"Dois acontecimentos gravíssimos ocorridos nos dias 12 e 24 ficaram eclipsados pelo impacto do 8 de janeiro", disse a senadora.
Sobre o dia 24, Elisiane afirmou que não foi uma ação de amadores ou "uma trapalhada qualquer, foi uma tentativa de ato terrorista". Ela se disse convencida de que, se a CPMI conseguir apurar quem foram os autores intelectuais e financiadores dos atos do dia 24, será "um grande passo" no contexto das investigações.
Os opositores apontaram problemas no plano de trabalho apresentado. O deputado federal Felipe Barros (PL-PR) concorda com a investigação em ordem cronológica, mas disse que a atuação da PRF no segundo turno está fora do escopo da CPMI. "O objetivo não é analisar as operações da PRF no dia do segundo turno, quando ainda sequer existiam pessoas nas ruas se manifestando. Se formos alongar para outros fatos, sugiro que investiguemos também atuação exagerada, para não usar outro termo, do TSE", afirmou o parlamentar paranaense.
O deputado Delegado Ramagem (PL-RJ), que chefiou a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) no governo Bolsonaro, também questionou o relatório de Elisiane. Para ele, não há como conectar a ação da PRF no segundo turno das eleições com o objeto da comissão. Segundo Ramagem, "As CPIs tratam de fato determinado e têm como base o fato determinado exatamente o requerimento de abertura da CPI ou CMPI."
A deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ) elogiou o plano de trabalho e afirmou que os atos golpistas só ocorreram porque existia o questionamento do resultado das eleições e da posse do presidente Lula. "Isso tudo foi um processo coordenado desde o processo eleitoral", destacou Jandira, que considerou correto o roteiro de Elisiane. "O 8 de janeiro não é só o 8 de janeiro, é um processo", afirmou a parlamentar.
O senador Rogério Carvalho (PT-SE) foi no mesmo sentido e apontou uma tentativa de "tirar o foco de quatro anos de construção e de estímulo contra a democracia, contra as instituições democráticas no Brasil". Para ele, os atos ocorridos no dia 8 foram "só a catarse de um povo desesperado que achava que teria um golpe no Brasil". O senador acrescentou que foi trabalhada a ideia de um golpe, que urnas questionadas e que o presidente eleito não tomaria posse.