O STF (Supremo Tribunal Federal) retoma nesta quarta-feira (20) o julgamento sobre a constitucionalidade do marco temporal para demarcação de terras indígenas. Ele é uma tese jurídica que considera terras indígenas somente aquelas ocupadas pelos povos tradicionais em 5 de outubro de 1988, a data exata da promulgação da Constituição Federal.
O julgamento foi suspenso no dia 31 de agosto, quando o ministro Luís Roberto Barroso, último a votar sobre a questão, proferiu o quarto voto contra o marco. O placar do julgamento está 4 votos a 2 contra a tese. Caso validado, poderá afetar 49% das identificadas como de ocupação tradicional indígena em Mato Grosso do Sul.
Até o momento, além de Barroso, os ministros Edson Fachin, Alexandre de Moraes e Cristiano Zanin se manifestaram contra o marco temporal. Nunes Marques e André Mendonça se manifestaram a favor.
Moraes votou contra o limite temporal, mas estabeleceu a possibilidade de indenização a particulares que adquiriram terras de "boa-fé". Pelo entendimento, a indenização por benfeitorias e pela terra nua valeria para proprietários que receberam do governo títulos de terras que deveriam ser consideradas como áreas indígenas.
A possibilidade de indenização aos proprietários por parte do governo é criticada pelo movimento indigenista. Para a Apib (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil), a possibilidade é “desastrosa” e pode inviabilizar as demarcações.
O Cimi (Conselho Indigenista Missionário) afirma que a possibilidade de indenização ou compensação de território vai aumentar os conflitos no campo.
Impacto em Mato Grosso do Sul
O Projeto de Lei foi proposto em 2007 pelo então deputado Homero Pereira com a intenção de trazer harmonia entre os Três Poderes sobre a demarcação de terras indígenas, já que o assunto estava restrito ao Poder Executivo, por meio da Funai (Fundação Nacional dos Povos Indígenas), na Lei nº 6.001/73, conhecido como Estatuto do Índio.
O PL 490/07 foi amplamente defendido pela bancada ruralista da Câmara e agora segue para votação no Senado Federal.
Já a quantidade de áreas de Mato Grosso do Sul que podem ser afetadas pelo Marco Temporal diverge de entidade para entidade.
Segundo estimativa da Funai, o Marco Temporal deve afetar 26 áreas em processo de demarcação. De acordo com levantamento da Famasul (Federação da Agricultura e Pecuária de Mato Grosso do Sul), este número pode ser ainda maior, com 34 áreas com processo demarcatório concluído (regularizadas ou homologadas), 15 em processo (delimitadas ou declaradas) e 15 em estudo. Ao mesmo tempo, existem mais de 150 propriedades ocupadas por indígenas, algumas com mais de vinte anos de ocupação.
Já o Cimi (Conselho Indigenista Missionário) afirma que é difícil precisar número de áreas, mas centenas de indígenas do Estado podem ser afetadas pelo Marco Temporal, já que há 119 acampamentos dos Guarani-Kaiowá, além dos acampamentos de outros povos.
Como votaram os deputados federais de MS sobre o Marco Temporal:
A favor
Beto Pereira (PSDB);
Luiz Ovando (PP);
Geraldo Resende (PSDB);
Marcos Pollon (PL);
Rodolfo Nogueira (PL).
Contra
Vander Loubet (PT);
Dagoberto Nogueira (PSDB);
Camila Jara (PT).
Entenda
No julgamento, os ministros discutem o chamado marco temporal. Pela tese, defendida por proprietários de terras, os indígenas somente teriam direito às terras que estavam em sua posse no dia 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal, ou que estavam em disputa judicial na época. Os indígenas são contra o entendimento.
O processo que motivou a discussão trata da disputa pela posse da Terra Indígena (TI) Ibirama, em Santa Catarina. A área é habitada pelos povos Xokleng, Kaingang e Guarani, e a posse de parte da terra é questionada pela procuradoria do estado.
Fonte: Funai – setembro de 2023 // Arte: Lennon Almeida